tag:blogger.com,1999:blog-59302658960419724062024-03-13T04:49:25.753-07:00Composto Substantivo"Imprudente ofício é este, de viver em voz alta." - Rubem BragaVitor Bornéohttp://www.blogger.com/profile/03105551521207136313noreply@blogger.comBlogger48125tag:blogger.com,1999:blog-5930265896041972406.post-88517384608353313252016-11-03T17:19:00.000-07:002016-11-03T17:19:08.043-07:00Parla<div style="background: white; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; text-align: justify;">
<span style="color: #222222; font-family: Arial, sans-serif; font-size: 10pt;">, eu
pedia. Eram as palavras que amava mais que tudo. Aquele jeitinho de escolher os
vocábulos, aquelas frases pausadas, minuciosamente compostas, tudo para
me dar tempo de madurar um significado. Em vão: salvo uma expressão ou
outra, tudo que ela dizia era um grande mistério para mim. E mesmo presos
em universos linguísticos diferentes, quando nos conhecemos, foi paixão a
primeira vista.</span></div>
<div style="background: white; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="background: white; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; text-align: justify;">
<span style="color: #222222; font-family: "Arial","sans-serif"; font-size: 10.0pt;">Talvez
tenha sido o vácuo deixado pelas palavras não compreendidas que nos levou
inexoravelmente um até o outro – ou, quem sabe, aquela musical cadência
com a qual ela falava que me atraiu. Verdade seja dita, foi atração feroz. Eu
não falava italiano e ela nada entendia do português, nem havia outra língua
comum, dado meu vergonhoso monoglotismo. Mas bastou escutar – amei desde
o primeiro instante aquele falar adventício.<o:p></o:p></span></div>
<div style="background: white; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="background: white; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; text-align: justify;">
<span style="color: #222222; font-family: "Arial","sans-serif"; font-size: 10.0pt;">Seu
nome. Foi seu nome o que ouvi primeiro. Tinha um "Chi" quase
impossível para meu aparelho fonador. Repetia incessantemente apenas para vê-la
rir da minha pronúncia. Uma risada cristalina. Universal. E ao nos entregarmos
pela primeira vez, foi nesse fonema que tive mais prazer: eu dizia seu nome ao
pé do ouvido, como uma invocação; ela gemia palavras estranhas,
estrangeiras.<o:p></o:p></span></div>
<div style="background: white; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="background: white; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; text-align: justify;">
<span style="color: #222222; font-family: "Arial","sans-serif"; font-size: 10.0pt;">Muitas
vezes, com palavras, nossa comunicação falhava. A maioria delas, na
verdade. Ela dizia <i>"No,
no, no!"</i> e eu já sabia que havia entendido errado. Ríamos
juntos. Mas o que os vocábulos não diziam, nossos lábios entendiam. Frequentemente
falávamos através de nossos corpos – criamos nossa própria língua franca de
gestos e sensações.<o:p></o:p></span></div>
<div style="background: white; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="background: white; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; text-align: justify;">
<span style="color: #222222; font-family: "Arial","sans-serif"; font-size: 10.0pt;">Nada
sabia sobre ela, tão pouco ela sobre mim. Desconhecia sua história. O que fazia
nessas terras tropicais. Ou o que via num brasileiro comum, ordinário,
monolíngue. Só sentia. Seus desejos, seus anseios. Tornamo-nos
dependentes um do outro. Aquela fala me fazia falta como me faz o ar, a água.
Aquela altura, viciei-me em seu idioma.<o:p></o:p></span></div>
<div style="background: white; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="background: white; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; text-align: justify;">
<span style="color: #222222; font-family: "Arial","sans-serif"; font-size: 10.0pt;">Passávamos
todo tempo livre juntos até que finalmente veio morar comigo. Tentava me
ensinar italiano com as partes de seu corpo, mas eu errava de
proposito, só para ouvi-la me corrigir. <o:p></o:p></span></div>
<div style="background: white; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; text-align: justify;">
<span style="color: #222222; font-family: "Arial","sans-serif"; font-size: 10.0pt;"><br />
<i>"Ripeto: La bocca... Il petto... La
figa." "No, no, no! La verità è coscia!"</i>,<o:p></o:p></span></div>
<div style="background: white; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="background: white; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; text-align: justify;">
<span class="il"><i><span style="color: #222222; font-family: "Arial","sans-serif"; font-size: 10.0pt;">“Parla!”</span></i></span><span style="color: #222222; font-family: "Arial","sans-serif"; font-size: 10.0pt;">, eu
dizia. E queria mais. E embriagava-me no seu vocabulário.<o:p></o:p></span></div>
<div style="background: white; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="background: white; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; text-align: justify;">
<span style="color: #222222; font-family: "Arial","sans-serif"; font-size: 10.0pt;">Mas um
dia, lembro-me bem daquele momento, eu a flagrei falando português. E não um
balbuciar ininteligível: foi um português preciso, ardilosamente pensado.
Eu disse <i>"Bravo!"</i>, mas no
fundo não gostei daquele som. No fundo me senti traído com aquela apropriação
linguística tão sorrateira.<span class="apple-converted-space"> <o:p></o:p></span></span></div>
<div style="background: white; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="background: white; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; text-align: justify;">
<span style="color: #222222; font-family: "Arial","sans-serif"; font-size: 10.0pt;">Talentosa,
dedicada, cada vez arriscava mais palavras na minha língua. E acertava
mais. E por mais que sempre dissesse <i>"In
italiano, per favore!"</i>, seu português não parava de melhorar.<o:p></o:p></span></div>
<div style="background: white; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="background: white; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; text-align: justify;">
<span style="color: #222222; font-family: "Arial","sans-serif"; font-size: 10.0pt;">Meu
italiano também já não era mais o mesmo. Por mais que resistisse, meu cérebro
teimava em traduzir o que eu ouvia... Os beijos eram apenas beijos. A boca era
apenas boca. <o:p></o:p></span></div>
<div style="background: white; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="background: white; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; text-align: justify;">
<span style="color: #222222; font-family: "Arial","sans-serif"; font-size: 10.0pt;">E
tivemos nossas primeiras brigas. E
quando na cama nos reconciliamos não foi <i>"Più!"</i> que ela sussurrou. E quanto mais perfeito era seu
português, menos eu a compreendia, menos a conhecia</span><span style="color: #222222; font-family: Arial, sans-serif; font-size: 10pt;">... E não tardou para não mais nos entendermos.</span></div>
<div style="background: white; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; text-align: justify;">
<br /></div>
<br />
<div style="background: white; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; text-align: justify;">
<span style="color: #222222; font-family: "Arial","sans-serif"; font-size: 10.0pt;">Sabia
que estávamos próximos ao fim. Mas foi só quando ela me disse "eu te
amo", com a mais perfeita das pronúncias, que tive certeza que estava
acabado: não falávamos mais a mesma língua.<o:p></o:p></span></div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
</div>
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://1.bp.blogspot.com/-Bbfy4kv2TcA/WBvS7ewuNpI/AAAAAAAABgQ/G7QvRjBlMckS6bAKTuTEVa0pNY8j7RRcgCLcB/s1600/Mouth.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="316" src="https://1.bp.blogspot.com/-Bbfy4kv2TcA/WBvS7ewuNpI/AAAAAAAABgQ/G7QvRjBlMckS6bAKTuTEVa0pNY8j7RRcgCLcB/s400/Mouth.jpg" width="400" /></a></div>
<div style="background: white; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; text-align: justify;">
<span style="color: #222222; font-family: "Arial","sans-serif"; font-size: 10.0pt;"><br /></span></div>
Vitor Bornéohttp://www.blogger.com/profile/03105551521207136313noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-5930265896041972406.post-86951582828930650842016-10-02T05:41:00.003-07:002016-10-02T05:46:43.648-07:00Por que ainda tenho amigos extremistas?<div style="background: white; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; text-align: justify;">
<span style="color: #222222; font-family: "arial" , "sans-serif"; font-size: 9.5pt;">Muita
gente tem me perguntado por que eu ainda mantenho pessoas extremistas no meu Facebook. Geralmente respondo, não sem algum humor, que faço pelo
entretenimento gratuito. Isso não chega a ser uma completa mentira, afinal, dou
mesmo algumas boas risadas diárias com o grau de fantasia que algumas postagens
atingem. Mas tão pouco é esse o único motivo.<o:p></o:p></span></div>
<div style="background: white; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="background: white; margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify;">
<span style="color: #222222; font-family: "arial" , "sans-serif"; font-size: 9.5pt;">Bem
verdade, seria mesmo mais justo dizer que faço isso por vários motivos. Talvez
o primeiro deles seja porque reconheço a rede social do Zuckerberg como um
retrato, ainda que sob lentes distorcidas, da sociedade em que vivemos. Uma
lista de amigos diversificada é um apanhado, um exemplo por amostragem, de uma
cidade, país, até de um tempo.<o:p></o:p></span></div>
<div style="background: white; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="background: white; margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify;">
<span style="color: #222222; font-family: "arial" , "sans-serif"; font-size: 9.5pt;">Seria
muito fácil excluir e bloquear todos que pensam diferente de mim do meu perfil.
Mas eles continuariam existindo a minha volta. E mais que isso, eu perderia a
oportunidade de conhecê-los melhor. Já foi o tempo em que por trás de teorias
da conspiração estapafúrdias estava alguém estranho com um chapéu de papel
alumínio. Os característicos skinhead e KKK não tem mais o monopólio do
preconceito (nem nunca tiveram, essa é a verdade). Através desse "convívio
virtual" percebi que pessoas comuns, algumas com elevado grau de
instrução, compram essas ideias. Parece impossível como aquele seu colega do TI
sempre tão prestativo e atencioso escreve todos os dias discurso de ódio na
Internet. Ou como aquela crush maravilhosa acredita piamente nos planos
diabólicos da Nova Ordem Mundial para o controle global.<o:p></o:p></span></div>
<div style="background: white; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="background: white; margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify;">
<span style="color: #222222; font-family: "arial" , "sans-serif"; font-size: 9.5pt;">Uma olhada
no feed desses indivíduos é muitas vezes igualmente reveladora. Postagem
clamando morte aos comunistas, vídeos de violência policial e fotos de
criminosos mortos brutalmente são entremeadas pelos característicos posts de
gatinhos, receitas de cookie e mensagens de autoajuda tão típicos de 90% dos
usuários da rede. Não se surpreenda se um minuto depois da imagem de feto
ensanguentado você chorar glitter com vídeo de um filhote de panda postado pela
mesma pessoa.<o:p></o:p></span></div>
<div style="background: white; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="background: white; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; text-align: justify;">
<span style="color: #222222; font-family: "arial" , "sans-serif"; font-size: 9.5pt;">Qual a
grande lição que tiro disso? Por mais que as vezes não queiramos admitir, os
extremistas não são tão diferentes de nós. São pessoas comuns, com belas esposas,
filhos queridos, cachorros amorosos e gatos mal-humorados. Estão sentados do
nosso lado na condução matinal ou o dia inteiro no trabalho. Estão na sua
igreja, mesa de bar, time de pelada. Estão na sua família.<o:p></o:p></span></div>
<div style="background: white; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="background: white; margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify;">
<span style="color: #222222; font-family: "arial" , "sans-serif"; font-size: 9.5pt;">Mas
então, não é perigoso que todo esse ódio se converta em violência real e
física? Minha experiência tem me dito que normalmente não. Ao menos
individualmente. A maioria vai descarregar sua frustração incontida nas redes
sociais, mas vai se limitar a propaganda. O problema é que a Internet pode não
ter inventado, mas organizou pela primeira vez a ignorância. E quando essas
pessoas se juntam, aí sim, o comportamento de matilha pode ser catastrófico.
Isso ajuda um pouco a entender como sociedades inteiras caminharam do desespero
para a barbárie após comprarem ideias monstruosas como a tábua de salvação.<span class="apple-converted-space"> <o:p></o:p></span></span></div>
<div style="background: white; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="background: white; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; text-align: justify;">
<span style="color: #222222; font-family: "arial" , "sans-serif"; font-size: 9.5pt;">E esse é
mais um motivo pelo qual os mantenho por perto. Se eu desisto dessas pessoas,
se admito que para seu discurso cheio de ódio e preconceito não há remédio, que
tipo de humanista eu sou? É muito fácil assumir que sou melhor que eles. Mas
somos feitos do mesmo barro. Se eu nego o potencial dessas pessoas para a
compaixão, não estaria negando minha própria compaixão?<o:p></o:p></span></div>
<div style="background: white; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="background: white; margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify;">
<span style="color: #222222; font-family: "arial" , "sans-serif"; font-size: 9.5pt;">Não é
fácil, não vou mentir. Meu estômago ainda se revira, meu sangue ainda ferve com
algumas das piores postagens. Por alguns segundos, quero xingar, humilhar,
ofender... Mas então eu lembro: de que adiantaria? Que bem a sociedade esse meu
alívio temporário traria? Nessas horas eu respiro fundo e, se tiver disposição
naquele momento, mostro educadamente outro ponto de vista. Sem ataques. Sem
bravatas. Não, não espere reciprocidade nessa compreensão. Mas não importa. Não
é por aplausos que você está debatendo. É maior que você.<o:p></o:p></span></div>
<div style="background: white; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="background: white; margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify;">
<span style="color: #222222; font-family: "arial" , "sans-serif"; font-size: 9.5pt;">Não
desista das pessoas. Por pior que sejam seus discursos, por mais ofensivos a
seus valores que eles possam lhe parecer. Quando você desiste de um ser humano,
está desistindo de lutar pela sociedade em que vive. Está endossando o mesmo
discurso de ódio da irrecuperabilidade que essas pessoas adotam. A barbárie
vence quanto o último perde a capacidade de ternura: combata o ódio com
compaixão. Educação muda o amanhã. Compaixão transforma o hoje.<span class="apple-converted-space"> <o:p></o:p></span></span></div>
<div style="background: white; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="background: white; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; text-align: justify;">
<br /></div>
<span class="apple-converted-space"><span style="color: #222222; font-family: "arial" , "sans-serif"; font-size: 9.5pt; line-height: 115%;">Foto: Imagem da Revolução
dos Cravos, Portugal, 25 de abril de 1974.</span></span><br />
<span class="apple-converted-space"><span style="color: #222222; font-family: "arial" , "sans-serif"; font-size: 9.5pt; line-height: 115%;"><br /></span></span>
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://1.bp.blogspot.com/-kmSYuKfMg2o/V_EAVnyoX2I/AAAAAAAABfA/neiZtayEt9IBNPCBJYd_U_RteGdiuBpqACLcB/s1600/revolu%25C3%25A7%25C3%25A3o%2Bdos%2Bcravos.JPG" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="265" src="https://1.bp.blogspot.com/-kmSYuKfMg2o/V_EAVnyoX2I/AAAAAAAABfA/neiZtayEt9IBNPCBJYd_U_RteGdiuBpqACLcB/s400/revolu%25C3%25A7%25C3%25A3o%2Bdos%2Bcravos.JPG" width="400" /></a></div>
<span class="apple-converted-space"><span style="color: #222222; font-family: "arial" , "sans-serif"; font-size: 9.5pt; line-height: 115%;"><br /></span></span>Vitor Bornéohttp://www.blogger.com/profile/03105551521207136313noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5930265896041972406.post-40202760053741919662015-12-31T14:52:00.002-08:002015-12-31T14:52:27.784-08:002016 e os Cavalos de Kafka<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
Uma crônica de fim de ano é uma das tarefas mais ingratas que um
escritor pode tomar para si. Todo mundo já sabe exatamente o que esperar desse
tipo de texto, é algo como o “especial do Roberto Carlos da literatura”. Mas
tudo bem, cá estou eu, e alguma coisa precisa ser dita. De cara me vem em mente
dois caminhos diferentes para essa crônica.</div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
O primeiro, uma longa lamentação das mazelas do ano que passou.
Isso iria render bastante, admito. Não me entendam mal, não acho
que 2015 tenha sido exatamente pior que os outros anos como um todo. Uma
tragédia aqui, outra ali... Altas tretas em Brasília (e no <i>Facebook</i>),
verdade. Tudo dentro da capacidade normal do ser humano de estragar tudo. Sem
ineditismo. Mas para a lamentação sempre há assunto. Poderia fazer uma
retrospectiva de acontecimentos gerais para cada ano de história
documentada e com cada uma arrancaria lágrimas. O mesmo vale para o ano
individualmente. Eu, particularmente, perdi uma mulher, um
emprego, dois peixes... Mas mesmo assim, não acho que para mim
tenha sido um ano pior que os outros 28 que já passaram. Penso que nós,
do auge da nossa eterna "síndrome da insatisfação" precisamos sempre
condenar o ano que se encerra. Isso e, é claro, nossa necessidade de esperança.
De acreditar que o ano seguinte será melhor, que coisas boas nos esperam, etc. Para
isso, chegar à conclusão que o ano passado foi uma bosta ajuda bastante – admita,
diminui bastante as expectativas. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
Isso me leva a segunda opção. Esta, já aviso, é igualmente
monótona e ainda mais piegas: a ideia aqui é centrar nos votos para o ano
seguinte, nas oportunidades e em tudo de maravilhoso que 2016 te reserva.
<i>Bullshit</i>! Ao menos que você ganhe na Mega da Virada, é improvável que
essas coisas sejam verdade. O ano novo de 2016 em si não te reserva
absolutamente nada. Você provavelmente fracassará no projeto verão,
entrará no outono ainda mais gordo e sem bronzeado de praia, e ainda cometerá
os mesmos erros que cometeu em 2015.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
E sabe por quê? Por que no fundo você também está esperando a mágica
da virada de ano! Como se a simples mudança de um número no calendário
gregoriano fosse mudar miraculosamente a mediocridade que você vive. Alô!
Acorda! Foi só mais um movimento de translação, só mais uma volta de uma
pedra enorme em torno de uma bola de fogo. Uma dentre milhões, infinitas
voltas. E nesta incrível dança mística você, meu caro, não significa
nada.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
Mas não se desespere. Não quero desencorajar você. Você é um vencedor,
afinal, sobreviveu a 2015 (muita gente não pode dizer o mesmo, acredite).
Amanhã não será o primeiro dia de 2016, do ano novo, blá, blá,
blá... Será, como dizem por aí, o primeiro dia do resto de sua vida. Assim como
depois de amanhã. E depois também. E isso é mágico. Isso é incrível. Essa
oportunidade que nos é dada todo santo dia. Nós, estas gotas de consciência num
mar de escuridão inerte. Que maravilha somos nós! Milagres do acaso, mesmo em
nossa mediocridade. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
<br /></div>
<br />
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
E para os caros amigos que estiveram ao meu lado ao longo deste ano,
só resta dizer: somos todos órfãos de estrelas mortas e é com grande prazer que
divido esse grão de poeira no tempo com vocês. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://4.bp.blogspot.com/-QUB4jH6c2xU/VoWxiWM5TWI/AAAAAAAABH8/Z_jBA5V5Hg8/s1600/2016%2Be%2Bos%2BCavalos.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="360" src="http://4.bp.blogspot.com/-QUB4jH6c2xU/VoWxiWM5TWI/AAAAAAAABH8/Z_jBA5V5Hg8/s640/2016%2Be%2Bos%2BCavalos.jpg" width="640" /></a></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
<br /></div>
Vitor Bornéohttp://www.blogger.com/profile/03105551521207136313noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5930265896041972406.post-75016497714318031452015-12-24T13:15:00.000-08:002015-12-24T13:15:07.017-08:00Natal<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
É véspera de Natal e faz um calor infernal. Estou em casa, ouvindo os
barulhos da ceia ficando pronta na cozinha. Já que o ar-condicionado está
proibido pela conta de luz, tento aliviar meu calor embaixo do ventilador. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
Esta manhã li sobre um rapaz que vive há 15 anos no aeroporto
internacional de Guarulhos. Denis. Acho que era esse o nome dele.
Quinze anos vivendo de caridade, num mundo onde o tempo é marcado por
pousos e decolagens. A história de Denis foi uma maneira indigesta de começar o
dia. Eles têm ar-condicionado nos aeroportos?<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
Aqui em casa somos poucos. Cristãos, menos ainda. Mas mesmo assim é
Natal e a mesa vai ficando cada vez mais cheia até meia-noite. Enquanto isso
fico variando de sofá e de ventilador. Sinto um frio da barriga, uma
coisa inexplicável que sinto todo Natal; talvez uma forma de compensar calor
infernal que sempre faz. Ou uma lembrança, uma lembrança de quando eu era
moleque e todas as expectativas de dezembro giravam em torno de um embrulho e a
tragédia máxima que poderia acontecer era Papai Noel esquecer de mim ou errar o
presente. Nunca aconteceu. Nunca esqueceu. Nunca errou. E rasgar as embalagens
meia-noite era realmente fantástico.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
<br /></div>
<br />
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
Agora cresci e meia-noite vou pensar no Denis. Na matéria também dizia
que todo Natal um comandante pagava um quarto de hotel para ele dormir numa
cama de verdade e tomar um banho. Chorei quando li isso. Estou chorando
agora, enquanto escrevo. Mas meia-noite estarei sorrindo. Não importa
meus problemas: pensarei no Denis, num quarto de hotel, deitando
numa cama macia e limpinha depois de uma boa ducha, com um sorriso enorme no
rosto. Feliz por estar ali. Feliz porque é Natal.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://1.bp.blogspot.com/-in0l1gpiVxY/VnxgJllNndI/AAAAAAAABHY/IwZDUVy_G7E/s1600/aeroporto-sao-paulo-do-natal-47143873.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="265" src="http://1.bp.blogspot.com/-in0l1gpiVxY/VnxgJllNndI/AAAAAAAABHY/IwZDUVy_G7E/s400/aeroporto-sao-paulo-do-natal-47143873.jpg" width="400" /></a></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
<br /></div>
Vitor Bornéohttp://www.blogger.com/profile/03105551521207136313noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5930265896041972406.post-30828917616030662722015-03-07T20:26:00.001-08:002015-03-07T20:31:04.048-08:00Doze respostas a quem “precisa do machismo”<p align="justify"> </p> <p>Hoje é dia 8 de março, dia Internacional da Mulher. Ao longo desta semana tenho lido toda uma gama de absurdos a respeito da data e do feminismo nas redes sociais. Na verdade o presente texto foi escrito originalmente para o Facebook. Escolhi um post que vem sendo compartilhado e sintetiza bem todos esses preconceitos e disparates e resolvi “responder”, item por item, para ajudar meus colegas homens (e incrivelmente, algumas mulheres!) a não passar vergonha compartilhando essas besteiras por aí. O texto do Eduardo Santos (na figura abaixo) que circula no Facebook e motivou esse texto, mostra como é possível dizer muitas mentiras usando apenas verdades: uma colagem de dados bem montada para refletir um ponto de vista machista e misógino.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify"><a href="http://lh3.ggpht.com/-n78wj5dQ4W4/VPvPXaTi4vI/AAAAAAAABCY/hbbO4Xt0t9Y/s1600-h/machismo.jpg"><img title="machismo" style="border-top: 0px; border-right: 0px; background-image: none; border-bottom: 0px; padding-top: 0px; padding-left: 0px; border-left: 0px; display: inline; padding-right: 0px" border="0" alt="machismo" src="http://lh3.ggpht.com/-qlpASvNTkm0/VPvPYINXP8I/AAAAAAAABCg/cnTkHXFdEXA/machismo_thumb.jpg?imgmax=800" width="433" height="238" /></a></p> <p align="justify"> </p> <p>O que segue então são alguns esclarecimentos e correções ao colega:</p> <p> </p> <p>1) Os casos de pensões são em geral favoráveis as mulher porque existe uma cultura do homem o provedor e a mulher dona de casa. Se a mulher deixa de trabalhar para viver em função a vida doméstica, é natural para a justiça que em caso de separação o homem mantenha uma pensão pelo tempo suficiente para ela se estabilizar. O tempo de pensões para ex-mulheres é cada vez mais curto e já existem vários casos no Brasil e no mundo homens que largaram o emprego para cuidar da casa RECEBENDO pensão de ex-mulheres.  Só não são mais numerosos porque a cultura ainda é patriarcal majoritariamente. Nos casos de pensão para os filhos, vale a mesma coisa. Quando o pai tem a guarda e a mãe tem dinheiro, ela paga pensão. Mas é raro acontecer isso, principalmente porque as disputas de guarda tendem a favorecer a mãe.  Não é feminismo. Nesse caso é ciência mesmo: vários estudos mostram que na espécie humana o vínculo  com a mãe nos anos de formação é maior por diversos fatores.</p> <p> </p> <p>2) Homens não tem um dia internacional só para si: “Tadinhos de nós, homens! Precisamos de um dia para reivindicar nossos direitos negados! Ei... mas que direitos são esses? Humm...”. </p> <p> </p> <p>Esse tipo de data marca geralmente um acontecimento histórico de luta ou tragédia para um determinado grupo. O Dia Internacional do Orgulho LGBT, por exemplo, começou como uma lembrança da Rebelião de Stonewall em 1969, quando homossexuais da comunidade local enfrentaram a polícia de Nova Iorque após uma série de abusos e perseguições inconstitucionais. O Dia Internacional da Mulher, para quem não sabe, remete ao Incêndio na fábrica da Triangle Shirtwaist, em 1911, também em Nova Iorque. No episódio, 123 mulheres e 23 homens morreram. As trabalhadoras, a maioria jovens imigrantes, trabalhavam 14 horas por dia, 60-72 horas por semana, costurando vestuários com salários de 6 a 10 dólares por semana e em condições precárias. A data também é associada a uma rebelião de funcionárias têxteis 1857, na mesma cidade. A coincidência de datas fez gerar muitos mitos em torno dos eventos. Na década de 1980, houve uma tentativa de negar a veracidade do evento, um revisionismo histórico que tinha como principal objetivo atacar o movimento feminista, que era muito vinculado ao partido comunista. Felizmente existem fotos do incêndio de 1911, registros de óbitos de operárias, enfim, inúmeros registros que provam que o evento não foi simplesmente inventado. Em dezembro de 1977, o Dia Internacional da Mulher foi adotado pelas Nações Unidas, para lembrar as conquistas sociais, políticas e econômicas das mulheres.</p> <p> </p> <p>Considerando essas informações, por que nós homens deveríamos ter um Dia Internacional do Homem? Quais são as nossas reivindicações? Quais são as nossas conquistas contra a “opressão feminina”? Vamos comemorar o fim da sociedade matriarcal, 8 mil anos atrás? </p> <p> </p> <p>3) Segundo um estudo do IPEA (fácil de encontrar na internet e disponível no site do instituto que cito nas fontes desse texto) a cada ano, ocorreram 5.664 mortes de mulheres por causas violentas: 472 a cada mês, 15,52 a cada dia, ou uma a cada hora e meia.  Outro dado demonstra que as mulheres jovens foram as principais vítimas da violência fatal. Mais da metade dos óbitos (54%) foram de mulheres entre 20 e 39 anos. Dizer que morrem mais homens que mulheres no Brasil por violência doméstica não é só absurdo e inverídico, como é irresponsável. Calunioso.</p> <p> </p> <p>4) Homens nas universidades: dado verdadeiro, mas deturpado. As mulheres realmente AGORA se tornaram maioria nas universidades. Isso é um fenômeno recente. E se deve ao simples fato de que os cursos majoritariamente femininos,  como os de licenciatura e pedagogia tem uma demanda muito grande por profissionais e consequentemente mais vagas que outros. As mulheres ainda são minoria na grande maioria dos cursos,  alguns com uma proporcionalidade totalmente masculina, como as engenharias e a medicina. A média remuneração pós-curso delas em pleno século XXI ainda é menor,  mesmo quando a formação é exatamente a mesma.</p> <p> </p> <p>5) Câncer de próstata e hospitais femininos: novamente é um fenômeno recente que morram tantos homens por câncer de próstata que mulheres por câncer de mama. Até algum tempo atrás  essa proporção era totalmente desequilibrada. Simplesmente porque proporcionalmente os casos de câncer de mama são mais frequentes que os de próstata. Ou seja: se gasta mais para prevenir o câncer de mama porque proporcionalmente tem mais casos. Só assim as mortes se tornaram proporcionais. A verdade é que estamos bem nesse sentido,  avançamos muito. E agora as campanhas de prevenção do câncer de próstata estão cada vez mais frequentes.</p> <p> </p> <p>Sobre Hospitais: hospitais de saúde da mulher estão diretamente relacionados ao sistema reprodutor. Tem mais hospitais de saúde da mulher do que de saúde do homem (eles existem!)  simplesmente porque a demanda é maior. Você tem ideia de quantos problemas no aparelho reprodutor feminino antes não podiam ser tratados e agora podem graças aos avanços na medicina? Mulheres também são as maiores vítimas da AIDS e em casos de estupro ou violência doméstica,  nem sempre recebem o devido tratamento num hospital comum. Tá explicado essa questão?</p> <p> </p> <p>6) 80% dos moradores de rua são homens: Dado verdadeiro, mas deturpado. Sim, é bem verdade que a maioria dos moradores de rua são homens. Mas tem diversos fatores relacionados a isso. Mulheres em situação de desamparo tem muitas vezes a opção (que não é exatamente uma vantagem) da prostituição. Ou muitas vezes se sujeitam a um casamento violento e infeliz para não ter que morar na rua. A sociedade é patriarcal e paternalista, o número de homens morando nas ruas é um reflexo disso. Olha outro dado curioso: um estudo recente em São Paulo mostrou que maioria dos moradores de rua, quase 93%, são viciados em drogas. A dependência química também é mais frequente entre os homens, por diversos aspectos (entre eles a maior facilidade de acesso). Ou seja: as duas coisas estão também relacionadas.</p> <p> </p> <p>7) Homens cometem 90% dos suicídios: Outro dado verdadeiro deturpado. Segundo dados da OMS, as mulheres tentam o suicídio 4 vezes mais que os homens, mas os homens o cometem (isto é, morrem devido a tentativa) 3 vezes mais do que as mulheres. Isso se explica pelo fato de os homens utilizarem métodos mais agressivos e potencialmente letais nas tentativas, tais como armas de fogo ou enforcamento, ao passo que as mulheres tentam suicídio com métodos menos agressivos e assim com maior chance de serem ineficazes, como tomar remédios ou venenos. Ou seja: os homens só morrem mais por suicídios por serem mais eficientes na hora de escolher os métodos. Freud explica.</p> <p> </p> <p>8) O serviço militar é obrigatório apenas para homens: no Brasil isso é verdade. Para começo de conversa serviço militar não deveria ser obrigatório para ninguém! Mas ok, tendo dito isso, cá estamos nós, colhendo mais um fruto de anos de patriarcalismo. É mesmo necessário explicar isso? As mulheres vêm lutando por direitos iguais nas forças armadas tem séculos e alguém ainda tem a capacidade de citar o alistamento militar como uma desigualdade para os homens? Menos vagas, acesso vetado em diversos segmentos, números alarmantes de estupros... Preciso continuar?</p> <p> </p> <p>9) Licença maternidade, aposentadoria e expectativa de vida: Já está mais que comprovado que o vínculo com a mãe nos primeiros meses e anos de vida na espécie humana é maior do que com o pai. É ciência, não é especulação. Tem diversos fatores evolucionários envolvidos nisso, mas alguns são bem óbvios. As mulheres amamentam (ou deveriam amamentar). Isso gera um vínculo muito forte. Tá aí o motivo para as mulheres terem licença maternidade de 180 dias e os homens de 5. Não subestimando o papel do pai e da paternidade, mas se fossemos dar para os dois 180 dias teríamos um problema sério de mão de obra. Então é mais lógico dar apenas para a mãe, que está biologicamente ligada a criança nos primeiros meses. Quando a mãe morre no parto, quando é incapaz, quando um homem adota uma criança sozinho, enfim, em todas essas situações ele também já tem acesso ao benefício. </p> <p> </p> <p>Homens trabalham 5 anos a mais por vários motivos, entre eles porque mulheres normalmente tem jornadas de trabalho duplas, na rua e em casa (os casais que dividem os afazeres domésticos ainda são minoria). Homens também tendem a conservar a força física por mais tempo, o que permitiria certos trabalhos até uma idade mais avançada. </p> <p> </p> <p>Ah, se homens vivem menos é porque comprovadamente tem hábitos menos saudáveis! A maioria dos fumantes são homens, a maioria dos consumidores de bebidas alcoólicas são homens, a maioria dos usuários de drogas são homens, homens também são mais competitivos, entram mais vezes em brigas e por isso tem mais chance de morrer de forma violenta. </p> <p> </p> <p>10) Quando o Titanic... sério?!?!: Sério mesmo que eu acabei de ler isso? Então... O Titanic afundou em 1912, lá se vão 103 anos. Se hoje a sociedade ainda é majoritariamente patriarcal, imagina naquela época? Ainda vigorava um forte código cavalheiresco, que colocava a mulher em uma posição de fragilidade, algo a ser protegido. Também pudera! Nessa época uma dama respeitável não trabalhava fora (não tinha renda), não estudava, etc... Sendo assim, os homens simplesmente deram seus lugares às mulheres nos botes salva-vidas. Mesmo hoje em dia os homens tendem a salvar as mulheres e crianças primeiro em desastres e catástrofes naturais. E tem um motivo biológico para isso: reprodução e perpetuação da espécie. É instintivo.</p> <p> </p> <p>11) Homens ocupam 95% de cargos como lixeiros, etc: outra verdade deturpada. Assim como nesses subempregos os homens são a maioria, em outros são as mulheres. Quase 100% das empregadas domésticas (que até pouco tempo nem direitos trabalhistas tinham) são mulheres, quase 100% das prostitutas são mulheres (que continuam sem ter direitos trabalhistas). Acrescentem nessa lista muitos outros empregos igualmente sacrificados, com jornadas de trabalho puxadas, como caixas de supermercados, atendentes de telemarketing, que são tipicamente femininos. </p> <p> </p> <p>12) O trabalho é cobrado apenas do homem: Isso é um dos problemas do machismo. Você não pode viver numa sociedade machista sem algumas consequências, não é verdade? Então, como o modelo é patriarcal, as pessoas ainda insistem em olhar o homem como um “provedor natural” e a mulher como uma “dona de casa natural”. Mesmo em pleno século XXI! Consequentemente, quem fica com fama de vagabundo se fica o dia inteiro no sofá é o homem.</p> <p> </p> <p>Se mesmo depois desses 12 itens você, homem, acha que “precisa do machismo”, que “precisa de um Dia Internacional do Homem”, ou coisa parecida, desculpa ae meu chapa, mas você deveria procurar mesmo é um terapeuta... </p> <p align="justify"></p> <p align="justify"> </p> <p align="justify"> </p> <p align="justify"><a href="http://lh4.ggpht.com/-kXqDuypk_4w/VPvPY9llw8I/AAAAAAAABCE/r7aoLXmp7bc/s1600-h/mulher%25255B4%25255D.jpg"><img title="mulher" style="border-top: 0px; border-right: 0px; background-image: none; border-bottom: 0px; padding-top: 0px; padding-left: 0px; border-left: 0px; display: inline; padding-right: 0px" border="0" alt="mulher" src="http://lh4.ggpht.com/-XbymyNJJuus/VPvPZSoDVKI/AAAAAAAABCQ/Za8egvdKTEg/mulher_thumb%25255B3%25255D.jpg?imgmax=800" width="500" height="375" /></a></p> <p align="justify"> </p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">FONTES:</p> <p align="justify"><a href="http://en.wikipedia.org/wiki/Triangle_Shirtwaist_Factory_fire">http://en.wikipedia.org/wiki/Triangle_Shirtwaist_Factory_fire</a></p> <p align="justify"><a href="http://www.abcdasaude.com.br/psiquiatria/suicidio">http://www.abcdasaude.com.br/psiquiatria/suicidio</a></p> <p align="justify"><a href="http://www.ons.gov.uk/ons/taxonomy/index.html?nscl=Suicide+Rates">http://www.ons.gov.uk/ons/taxonomy/index.html?nscl=Suicide+Rates</a></p> <p align="justify"><a href="http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/ribeiraopreto/2013/08/1331884-maioria-dos-moradores-de-rua-sao-homens-desiludidos-com-o-amor.shtml">http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/ribeiraopreto/2013/08/1331884-maioria-dos-moradores-de-rua-sao-homens-desiludidos-com-o-amor.shtml</a></p> <p align="justify"><a href="http://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/130925_sum_estudo_feminicidio_leilagarcia.pdf">http://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/130925_sum_estudo_feminicidio_leilagarcia.pdf</a></p> <p align="justify"><a href="http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=21827">http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=21827</a></p> <p align="justify"><a href="http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&id=19873">http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&id=19873</a></p> <p align="justify"><a href="http://www.jb.com.br/pais/noticias/2015/03/04/lei-maria-da-penha-reduziu-violencia-domestica-contra-mulheres-segundo-ipea/">http://www.jb.com.br/pais/noticias/2015/03/04/lei-maria-da-penha-reduziu-violencia-domestica-contra-mulheres-segundo-ipea/</a></p> Vitor Bornéohttp://www.blogger.com/profile/03105551521207136313noreply@blogger.com5tag:blogger.com,1999:blog-5930265896041972406.post-16907043579528160552014-12-31T19:58:00.001-08:002014-12-31T19:58:43.549-08:00Adeus ano velho, feliz ano velho<p align="justify">Enquanto caminho minha mente divagava para fugir do calor.  Está acabado. Toda a pungência louca de dezembro culminando em um grande  show  pirotécnico,  beijos e abraços na praia. Mas não estou na praia.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Estou caminhando de volta para casa. Os relógios da Rua Dias da Cruz apontam que 2015 começara já faz uma hora. A hora deve estar certa, mas duvido dos 32 graus que mostra o termômetro. Com o suor grudando minhas roupas no corpo, sinto-me mais em <i>Arrakis</i> que no subúrbio do Rio de Janeiro. Famílias passam por mim com suas expressões de fim de festa,  regressando para seus respectivos lares. Vez ou outra algum fogos de artifício atrasado ainda se faz ouvir, quebrando o silêncio da noite. Sempre odiei fogos de artifício. Barulho e fumaça nunca foram meu ideal de comemoração.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">E eles estavam ali... Na calçada,  sob uma marquise. Um casal dormindo entre um amontoado de pertences. Não. Não apenas um casal. Havia também uma terceira criatura. Uma criança que a primeira vista tomei por um trapo. Mesmo com todo o calor que fazia os três estavam tão juntos quanto se estivesse protegendo-se de um rigoroso inverno. Aquilo me deu uma sensação de sufocamento. Depois pensei que eles realmente precisavam de calor. </p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Calor humano. A indiferença é fria. Para aqueles três era só mais um dia,  só mais uma noite. Não trocaram beijos e abraços a meia-noite. Não havia ano novo.  Há muito tempo que não havia nada de novo em suas vidas. Em 2015 não descumpririam promessas – há anos não faziam nenhuma. </p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Só mais uma noite. Uma noite barulhenta. Não haveria nada de novo amanhã. Porque o calendário perde o sentido quando você é ninguém. Ninguém não conta os dias. Os dias são iguais para ninguém.</p> <p align="justify"><a href="http://lh3.ggpht.com/-jRA8qay09AU/VKTF7Px6wxI/AAAAAAAAA_8/kI2kpmwcs3M/s1600-h/R%2525C3%2525A9veillon%25255B6%25255D.jpg"><img title="Réveillon" style="border-top: 0px; border-right: 0px; background-image: none; border-bottom: 0px; padding-top: 0px; padding-left: 0px; border-left: 0px; display: inline; padding-right: 0px" border="0" alt="Réveillon" src="http://lh5.ggpht.com/-p03iXEOikfA/VKTF8QyTwQI/AAAAAAAABAE/EQTz6NSeYVs/R%2525C3%2525A9veillon_thumb%25255B4%25255D.jpg?imgmax=800" width="500" height="370" /></a></p> Vitor Bornéohttp://www.blogger.com/profile/03105551521207136313noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5930265896041972406.post-78690602896768968682014-12-25T09:20:00.001-08:002014-12-25T09:21:33.055-08:00Crônica de Natal<p align="justify">Essa é, talvez, a mais estranha de todas as épocas do ano para mim. Não sei se é o calor - o calor sempre me incomoda. Ou se porque não sou nem nunca fui cristão. Mas o Natal aqui no Rio de Janeiro sempre me pareceu uma data... Exótica.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Não me entendam mal, eu sempre gostei de Natal. Bem verdade que poderia destilar linhas e mais linhas de críticas. O calor, a enorme quantidade de pessoas nas ruas lotando os shoppings e lojas, estapeando-se pelo melhor preço,  comprando presentes para meio mundo só pela perspectiva de ganhar um par de meias a meia-noite. Um consumismo ilimitado que acaba com uma fatura estourada do cartão de crédito em janeiro. Sem falar que a coisa toda não tem nada haver com a gente! Pinheiros? Neve? Frutas cristalizadas? Alguém realmente gosta daqueles pedaços de caco de vidro colorido que alguma bruxa má um dia misturou na massa do panettone? Já mencionei o calor? Enfim... Eu poderia falar sobre tudo isso.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Mas como disse antes,  eu gosto do Natal. Gosto do "clima". Da ideia das pessoas se reunindo. Gosto também de dar e receber presentes,  confesso. Demonstrar afeto. Principalmente quando tem crianças. Não me importa se Papai Noel é São Nicolau ou criação da <i>Coca-cola</i>. As crianças parecem gostar da história desse pobre homem que vem aqui no calor dos trópicos com roupas de inverno só para entregar presentes. Claro que  fico triste quando penso nas milhares que não vão receber nada. Nem do Noel,  nem do pai,  nem da mãe. Mas culpar o Natal e o bom velhinho por essas frustrações tão cruéis e uma enorme injustiça. Perfeito seria um mundo onde todas as crianças pudessem sonhar como iguais. Mas enquanto não humanizam o Capital, permito-me sim,  um pouco de fantasia.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Quando era moleque e minha avó ainda era viva,  minha tia e meu tio nos levavam - eu,  mãe e avó - de carro para ver as decorações de Natal da Barra,  Recreio e da Zona Sul. Eu ficava fascinado com aquelas luzes,  com os presépios. A orla do Rio parecia ter o dobro de luz. Passar de carro pelo elevado Niemeyer à noite. Hoje em dia passo por lá e acho tudo tão sem graça,  morto. Não sei se as pessoas gastam menos com pisca-pisca atualmente ou meus olhos que perderam aquele deslumbramento infantil.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Eu ia dizendo, esse casal de tios morava longe, lá em Belém (mas não a do menino Jesus,  a do Pará mesmo), então quando estavam aqui numa data dessas era um acontecimento. A casa ficava cheia,  minha avó era a matriarca. Faltava mesa para tanta comida. A velha adorava Natal. Gostava tanto que foi arrumar de morrer logo num dia 24 de dezembro.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Depois disso claro que não foi a mesma coisa. Não foi só a data que ficou marcada. Era o fator agregador que faltava.  Nos primeiros anos eu coloquei alguma pilha para manter as tradições,  montar a ornamentação. Mas a data trazia recordações demais para minha mãe. Com o tempo aceitei que o tal espírito de Natal estava mesmo meio mudado por essas bandas. Nada de grandes reuniões com família toda – e uma porção de agregados – ou pisca-piscas que faziam a sala parecer uma boate. Sem grandes decorações.  Mas a comida não. Continuou sendo para um batalhão. Minha mãe herdou não só o matriarcado, mas o exagero culinário.  E alguém sempre vinha,  nem que fossemos meia dúzia de gatos pingados.  Nunca aceitamos o convite para ir passar a data na casa de ninguém. Era simples, mas era o nosso Natal.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Esse ano foi surpresa minha quando cheguei da rua e encontrei o buffe da sala cuidadosamente decorado para o Natal. "Deixei a magia entrar de novo.", minha mãe disse. "Ela nunca saiu. Você não sabe, mas nunca a deixou ir embora" quis responder, sorrindo, com os olhos cheios d'água. Mas não disse. Porque sou assim mesmo.</p> <p align="justify"><a href="http://lh5.ggpht.com/-nk1tFqetUmM/VJxHXBdAoJI/AAAAAAAAA_g/8EbgFNTyhIM/s1600-h/natal7.jpg"><img title="natal" style="border-left-width: 0px; border-right-width: 0px; background-image: none; border-bottom-width: 0px; padding-top: 0px; padding-left: 0px; display: inline; padding-right: 0px; border-top-width: 0px" border="0" alt="natal" src="http://lh3.ggpht.com/-o1o9dEdN-kc/VJxHX5ljsMI/AAAAAAAAA_o/trVWpeKW5fA/natal_thumb5.jpg?imgmax=800" width="500" height="370" /></a></p> <p align="right"><font size="2">Em memória a dona Nilza,  que era a avó mais resmungona do mundo, mas também fazia as melhores rabanadas e me fez amar o Natal. Obrigado por ter feito parte da minha vida.</font></p> Vitor Bornéohttp://www.blogger.com/profile/03105551521207136313noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-5930265896041972406.post-54182748870952900342014-12-23T16:40:00.001-08:002014-12-23T16:40:14.469-08:00O Trenó<p>"Papai Noel não existe.",  sentenciou o pequeno,  meio emburrado,  meio entristecido.</p> <p> </p> <p>"Como? Quem te falou isso,  filho?" respondeu o pai,  retirado de sobressalto do seu telejornal noturno.</p> <p> </p> <p>"Ninguém,  ué. Eu sei!"</p> <p> </p> <p>"Como assim ninguém? Da onde você tirou isso então?"</p> <p> </p> <p>"Deixa de ser bobo,  papai! Renas não voam."</p> <p> </p> <p>"Mais é claro que voam!" indignado.</p> <p> </p> <p>"Elas nem têm asas!"</p> <p> </p> <p>"Os balões? Não voam? Balão não tem asa!"</p> <p> </p> <p>Uma sombra de dúvida passou pelo rosto do pequeno.</p> <p> </p> <p>"Como é que eles voam então?"</p> <p> </p> <p>"É mágica,  ué!"</p> <p> </p> <p>"Mágica não existe. Tô muito grande para acreditar nisso."</p> <p> </p> <p>"Ora, mas você está demais hoje! Mágica existe sim!"</p> <p> </p> <p>"Não existe."</p> <p> </p> <p>"Quer ouvir um segredo?"</p> <p> </p> <p>"Conta."</p> <p> </p> <p>"Quando eu era criança,  eu vi Papai Noel..."</p> <p> </p> <p>"Ah, eu também vi um monte de vezes, no shopping! Mas aquele não..."</p> <p> </p> <p>"... Não é Papai Noel de verdade. Eu sei! Não é disso que eu tô falando. Eu vi Papai Noel mesmo, o chefe,  na noite de Natal!"</p> <p> </p> <p>Os olhos do menino se arregalaram como os quem acaba de receber uma grande revelação.</p> <p> </p> <p>"Você viu ele entregando os presentes?"</p> <p> </p> <p>"Mais ou menos... Na verdade foi o trenó."</p> <p> </p> <p>"O trenó?"</p> <p> </p> <p>"Isso. A luz do trenó, passando. Vi pela janela."</p> <p> </p> <p>"Hum...Tinha renas voando?"</p> <p> </p> <p>"Foi muito rápido,  imagina quantos presentes ele não tinha que entregar ainda? Mas é claro que tinha renas voando. "</p> <p> </p> <p>"Hum..."</p> <p> </p> <p>"Viu? Eu disse que o Papai Noel existia."</p> <p> </p> <p>Com um sorriso repentino, saiu correndo para o quarto. O pai voltou a assistir o jornal. Alguns minutos depois preocupado com o silêncio,  gritou:</p> <p> </p> <p>"O que você está fazendo?"</p> <p> </p> <p>"Escrevendo uma carta para o Papai Noel."</p> <p> </p> <p>"Você já não tinha escrito?"</p> <p> </p> <p>"Tinha,  mais achava que Papai Noel era você e a mamãe. Agora que sei que não é,  tô dizendo que não vou querer mais um boneco do Batman."</p> <p> </p> <p>"Ah, não? E você vai pedir o que então?"</p> <p> </p> <p>"Um PlayStation 4!"</p> <p> </p> <p>Fez silêncio. O pai refletiu por alguns segundos, pegou o controle remoto e desligou a tevê. Ajeitou-se no sofá, virou para o quarto e chamou:</p> <p> </p> <p>"Filho,  vem cá! Papai precisa conversar com você sobre Papai Noel..."</p> <p><a href="http://lh4.ggpht.com/-mW-jk3cdckY/VJoLaiXLKmI/AAAAAAAAA_I/JDetnBcXbnA/s1600-h/playsation4%25255B3%25255D.jpg"><img title="playsation4" style="border-top: 0px; border-right: 0px; background-image: none; border-bottom: 0px; padding-top: 0px; padding-left: 0px; border-left: 0px; display: inline; padding-right: 0px" border="0" alt="playsation4" src="http://lh6.ggpht.com/-B1YDrRFjlHk/VJoLbO8HokI/AAAAAAAAA_Q/6fx8VRBkgaU/playsation4_thumb%25255B2%25255D.jpg?imgmax=800" width="500" height="375" /></a></p> Vitor Bornéohttp://www.blogger.com/profile/03105551521207136313noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5930265896041972406.post-19888037360755632022014-12-11T16:46:00.001-08:002014-12-11T17:04:11.152-08:00Manifesto Despudorado<p align="justify">Permitam-me, leitores, o anacronismo desse texto – sonhei que escrevia um manifesto à moda antiga, com ares de pau-brasil,  de antropofágico. Permitam-me também certa dose de pedantismo sem o qual fugiria  ao do próprio gênero que me proponho.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Tenho observado que em pleno século XXI o pudor ainda atormenta a arte. Causa-me angústias ver como o poeta constrange-se, o romancista encabula-se,  o cronista censura-se. Buscam fórmulas do que pode e não pode,  ora intimidados pelo politicamente correto,  ora amarrados pelos fios invisíveis da teoria literária.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Em tempos de hipocrisias mil,  senti que regredimos ao invés de avançar – as terras que deveriam abrigar um grande florescer criativo,  tornam-se um campo estéril e minado.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Pus-me então a escrever: é chegado,  senhores, o momento de um basta!</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Clamo você, autor, não a razão. Esta é inimiga da arte. Clamo-te a emoção. Invoco bênção das nove musas. E escrevo.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Escrevo com a certeza que o texto precisa livrar-se da mácula do politicamente correto,  da ideologia. Permitir-se mesmo a pura e simples inutilidade. Não ter compromisso com nada nem ninguém além de si próprio.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Escrevo em defesa da literatura de seios à mostra. Desavergonhada. Despudorada.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Pois literatura precisa perder o pudor.  Usar minissaia,  fazer topless.  Para o texto não pode haver tabus, tão pouco fórmulas de perfeição. Não existe, nem nunca existirá, assunto,  palavra ou estrutura proibida à obra.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Perdoai os que têm medo de escrever <i>McDonald's</i>,  <i>Coca-cola</i>, <i>PlayStation</i>, <i>iPhone</i>! Perdoai,  irmãos e irmãs, os que prostituem seu texto e sua literatura a serviço de uma "mensagem maior",  qualquer que seja. Estes não sabem o que fazem. Não sabem que reduzem o texto a mero instrumento. O texto não é um instrumento.  O texto é a causa. A literatura não é um meio. É o fim em si.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Vamos desvencilhar-nos da métrica, do modo. Das empobrecedoras constantes. Escrever da direita para esquerda,  da esquerda para direita ou de cabeça para baixo. Só para depois compor um soneto italiano. Porque a arte é assim: volúvel a vontade da criação.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Vamos falar de xotas, bucetas, paus, pirocas, estupros, incestos, pedofilia, antropofagia, megalomania, machismo, fascismo... Vamos falar de política. E de amor.  Falemos também de amor, por que não? Hoje em dia não existe putaria maior que esta. Não existe tema mais desavergonhado.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Vamos profanar o sagrado e sacramentar o profano. Porque maldita é a lira que se apraz do óbvio.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Disse e repito: o texto não pode ter pudor.  Não pode se privar do velho,  nem do novo.  Não há  águas imbebíveis para o texto.  O texto deve ser despudorado,  desavergonhado.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Deve ser nu.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Olhar uma folha em branco deve ser mais que olhar um caleidoscópio, uma infinidade de possibilidades. Deve ser um ato de voyeurismo.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Sonho com o dia em que o Despudorismo vai virar uma tendência.  E teremos aqui no Rio a Semana de Arte Despudorada.  E iremos todos nus: se não de roupas, ao menos de alma.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify"><a href="http://lh5.ggpht.com/-qWXFK6jbA0o/VIo63RdFCBI/AAAAAAAAA-c/a4uT4fIT808/s1600-h/topless%25255B7%25255D.jpg"><img title="topless" style="border-top: 0px; border-right: 0px; background-image: none; border-bottom: 0px; padding-top: 0px; padding-left: 0px; border-left: 0px; display: inline; padding-right: 0px" border="0" alt="topless" src="http://lh6.ggpht.com/-T3oXczlQJZA/VIo64KJ7hEI/AAAAAAAAA-k/EE_qvCBaBRU/topless_thumb%25255B4%25255D.jpg?imgmax=800" width="500" height="375" /></a></p> Vitor Bornéohttp://www.blogger.com/profile/03105551521207136313noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5930265896041972406.post-66317255887986055522014-11-28T20:10:00.001-08:002014-11-29T04:05:55.891-08:00E agora, quem poderá nos defender?<p align="justify">Hoje a noite quando sai do trabalho fiquei com os olhos cheios d'água ao checar o Facebook pelo celular. A notícia era de uma perda. Notícia de morte. Nunca o vi pessoalmente e mesmo assim tive a sensação de que morria um conhecido. Nunca entendi essa ligação que as pessoas têm com figuras públicas,  reações de se descabelar e chorar. Nunca entendi até esse momento. Decidi então que precisava escrever sobre isso – o cronista antes de qualquer coisa é um oportunista, um abutre de emoções e cenas.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Mas o que dizer,  leitor? O que dizer? O que posso escrever que já não foi dito? Que os deuses me livrem de cair nas obviedades! Ai de mim! Você,  navegante de primeira viagem – também fã da ainda não citada figura pública e atraído até aqui pelo assunto – certamente fecharia este periódico para nunca mais voltar. E o outro,  já leitor habitue, diria "ora, mas que marasmo! O Bornéo tá perdendo a mão!". Difícil tarefa essa que me designei! Mas agora,  aqui,  do alto do terceiro parágrafo depois de períodos tão longos,  não me resta escolha se não continuar.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Acho que já passou da hora de mencionar para quem é dedicado este post. Ao menos que você viva numa bolha,  provavelmente já deduziu,  claro. Talvez até também tenha ficado com olhos marejados quando abriu sua rede social hoje (porque nesses dias me parece que ninguém mais fica sabendo de nada realmente importante pelos jornais) e viu noticiado o falecimento de Roberto Gómez Bolaños,  o Chespirito, El Chavo, ou simplesmente,  Chaves. Não se envergonhe desse sentimento,  caro leitor. Provável que quem lhe manda as lágrimas é uma criança aí,  a muito esquecida. Aceite-as como um presente. Uma dádiva que é dada aos que mantiveram viva alguma luz da tenra infância.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Para que se sinta menos constrangido em chorar por Roberto,  vou contar-lhes um segredo. Não do tipo secreto;  esses a gente não coloca na Internet. Mas ainda sim é um segredo, na medida em que nunca foi dito. Pois bem, sem mais delongas porque o post já está ficando longo e paciência do leitor hoje em dia é curta: algum tempo atrás,  não sei exatamente precisar a data, mas foi depois do Carnaval e antes  da Copa do Mundo,  fiquei alguns dias em casa,  adoentado. Num desses dias,  movido pelo mais profundo tédio de ficar na cama sem fazer nada, pus-me a zapear os canais de tevê. Acabei parando em um episódio de Chaves. Com um único olhar reconheci que era o episódio em que a vila toda vai de férias para Acapulco (ou Guarujá,  se o leitor assim preferir). </p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">(Não sei se você já viu esse episódio.  Se não, corra para o YouTube e corrija imediatamente esta falha grave como ser humano.)</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Então, falava do episódio. (SPOILER ALERT!) Neste todos os personagens viajam e o Chaves é o único que fica na vila. As luzes vão escurecendo e Chaves fica sozinho... Então chega o Sr. Barriga e o convida para ir também. Neste momento,  caro leitor,  eu já estava em lágrimas. Impossível precisar quantas vezes eu já tinha visto esse episódio. Nunca havia chorado. Mas naquele dia,  sozinho naquela tarde,  experimentei uma emoção inédita. Não saberia explicar o porquê. Ou talvez eu saiba, mas precisaria de outro post inteiro.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Fim da minha história secreta. Fim também desta crônica. Não quero cansar mais você leitor com melancolias. Esta é uma despedida que deve ser grave, não triste. As lagrimas que por ventura derramarem – assim como as minhas hoje de tardinha e naquela outra tarde, entre o Carnaval e Copa – serão um tributo. Morreu Roberto Bolaños. Mas com o Chespirito não se preocupem! Este passa bem. É imortal.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify"><a href="http://lh3.ggpht.com/-ktCO8zLT_cg/VHlHSuHnVzI/AAAAAAAAA94/t1VxTAwqfjc/s1600-h/foto11%25255B3%25255D.jpg"><img title="foto11" style="border-left-width: 0px; border-right-width: 0px; background-image: none; border-bottom-width: 0px; padding-top: 0px; padding-left: 0px; display: inline; padding-right: 0px; border-top-width: 0px" border="0" alt="foto11" src="http://lh5.ggpht.com/-NM-cjsr-_-0/VHlHTXNi_TI/AAAAAAAAA-A/vHwCbk_PJ9g/foto11_thumb%25255B2%25255D.jpg?imgmax=800" width="500" height="375" /></a></p> Vitor Bornéohttp://www.blogger.com/profile/03105551521207136313noreply@blogger.com3tag:blogger.com,1999:blog-5930265896041972406.post-54495781670965388572014-11-22T19:59:00.001-08:002014-11-23T18:19:14.950-08:00Gesta de amante<p align="justify"> </p> <p align="justify">Não sou quem pensou que fosse. Sei que és princesa,  mas eu... Eu sou apenas um plebeu. Não tenho realeza. Nem títulos. Nem nobreza. Minha história é simples como de um lavrador que amanha a terra para tirar-lhe o sustento.  Não tenho muito que lhe dar. Minhas posses se resumem a esse cavalo baio e tudo que pode carregar. Minha riqueza está na terra que piso,  na poeira que levanto. Nos livros que li e guardei comigo. Está nas flores inesgotáveis que admiro. Nos sorrisos que arranquei, nas lágrimas que verti. É o voo da borboleta e o canto do passarinho. A inquietação metafísica com o sofrimento do mundo. Se te interessam essas posses então vem comigo. Sobes na garupa. </p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Vem,  foge pro litoral! </p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Que serás rica. Vou te fazer imperatriz num castelo de areia. E nas noites nadaremos juntos,  nus como há de ser a liberdade. E faremos amor na praia, sob o luar. No teu ventre plantarei um filho. E depois outro. E nossos filhos darão inveja a Botticelli. E multiplicar-se-ão mundo afora. E herdarão nosso reino –  apenas o horizonte será o limite de nossas paragens. E quando morrermos,  bem velhinhos, quando morrermos há ainda uma estrela de cruzar o céu. Jogar-se-á,  aqui na Terra, nesta pequenina  terra, só para vislumbrar esta canção chegar ao final.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify"><a href="http://lh6.ggpht.com/-w5AlT45Z900/VHFbkSgb6EI/AAAAAAAAA9Q/3l9fk49nYz8/s1600-h/gesta%252520de%252520amante%25255B4%25255D.jpg"><img title="gesta de amante" style="border-left-width: 0px; border-right-width: 0px; background-image: none; border-bottom-width: 0px; padding-top: 0px; padding-left: 0px; display: inline; padding-right: 0px; border-top-width: 0px" border="0" alt="gesta de amante" src="http://lh3.ggpht.com/-SvOL-4CVtLc/VHFblEQJoHI/AAAAAAAAA9U/-jJ-8NxY_AE/gesta%252520de%252520amante_thumb%25255B2%25255D.jpg?imgmax=800" width="500" height="375" /></a></p> Vitor Bornéohttp://www.blogger.com/profile/03105551521207136313noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-5930265896041972406.post-73395661864291710572014-11-16T18:44:00.001-08:002014-11-16T18:50:39.454-08:00O placa<p> </p> <p>Sua função era não ser notado. Era menos importante do que a placa que vestia,  como um cavalete. "Lan House no segundo andar" – a mensagem não podia ser mais simples. Só tinha entrado na tal "lan house" uma vez,  para entrevista. Todo dia pegava e guardava seu instrumento de trabalho/uniforme num almoxarifado da própria galeria que ficava plantado na porta. </p> <p> </p> <p>"Esse é um trabalho importante" eles disseram. "Você será a empresa lá fora,  o chamariz. Esse ramo de publicidade humana está crescendo muito. Se fizer um bom trabalho como placa aqui,  quem sabe um dia você possa chegar a outdoor.” Sentiu-se imbuído de uma importante tarefa. Abrir mão das vaidades individuais para promover a empresa. O importante era esquecer-se de si mesmo. Ali ele era só a placa. A mensagem. </p> <p> </p> <p>Quando chegou em casa e deu a notícia a esposa era só alegria. “Vai tirar de letra!” – disse a mulher. De fato, tinha certa experiência.</p> <p> </p> <p>Havia sido caixa em um supermercado. Somar,  somar na maquina registradora, pegar o dinheiro. Subtrair na máquina registradora. Trôco. “Cartão?” “Débito ou Crédito?” “O senhor já tem cartão do mercado?” “Não quer fazer uma recarga de celular?” Entre um produto e outro, arriscava um comentário, uma observação. Custou-lhe o cargo. “Você não é pago para falar, é pago para fazer a fila andar.”</p> <p> </p> <p>Mas foi a experiência numa <i>call center</i> que lhe servia agora. Operador de Telemarketing. Na época o nome o impressionara bastante. Era uma sala enorme com várias pessoas atendendo telefones e fingindo serem computadores. “Converse o mínimo possível. Nosso objetivo aqui é ser tão eficiente quanto um computador. Computadores conversam? Não. Não fuja do roteiro.” Esforçava-se para não cair em tentação. Dizia para si mesmo que as vozes não eram de pessoas. Não havia humanos do outro lado da linha. Mas quando achava que estava pegando o jeito,  o mandaram embora. "Você é pessoal demais." A nova demissão foi bastante frustrante. Quase entrara em depressão.</p> <p> </p> <p>Agora tinha uma nova oportunidade. Parecia fácil. Não ia errar dessa vez. Afinal,  precisava daquele salário. Pontualmente estava lá,  todo dia, quinze para as nove da manhã, vestindo seu instrumento de trabalho. Nos primeiros dias foi pesado, ficar em pé tanto tempo. Depois se acostumou. Não precisava falar. Não precisava sorrir. Nem entregar papéis. Nada.</p> <p> </p> <p>A concentração era tanta que para aperfeiçoar-se resolveu falar o mínimo possível mesmo fora do horário de serviço. Não podia perder aquele emprego! Chegava em casa, beijava a esposa, olhava para a mesa da cozinha. Murmurava pelo jantar. Depois passou a gesticular. Um tapinha nas costas era o boa noite. Aos poucos a boca foi ficando seca. Foi esquecendo as palavras.</p> <p> </p> <p>Ele era a placa.  E era uma ótima placa! Ninguém olhava seu rosto. Ninguém lhe dava bom dia. Viu como era bom no que fazia quando um casal parou na sua frente e a moça apontou. – “Olha a placa, amor! Você não queria uma <i>lan</i>?” Um dia,  quando chegou em casa notou que ainda vestia sua placa.</p> <p> </p> <p>Suas costas começaram a enrijecer. Depois foram as pernas. Melhor,  conseguia ficar mais firme em sua posição. Não havia dor. Era uma espécie de resiliência adquirida. Como as palavras, flexibilidade não lhe era importante. Estava se tornando cada vez mais perfeito.</p> <p> </p> <p align="center">***</p> <p> </p> <p>A mulher chegou do mercado, atrapalhada, abriu a porta em meio às sacolas. Soltou um grito. No lugar onde normalmente estaria sentado seu marido, havia apenas uma placa: “Lan house no segundo andar”.</p> <p> </p> <p><a href="http://lh4.ggpht.com/-5e18HE1ME3c/VGlhDolojwI/AAAAAAAAA80/WJ3cs4WhVKQ/s1600-h/homem%252520placa%25255B6%25255D.jpg"><img title="homem placa" style="border-top: 0px; border-right: 0px; background-image: none; border-bottom: 0px; padding-top: 0px; padding-left: 0px; border-left: 0px; display: inline; padding-right: 0px" border="0" alt="homem placa" src="http://lh6.ggpht.com/-cx69T5k3PqU/VGlhESyXqKI/AAAAAAAAA84/n1PdMLysj8o/homem%252520placa_thumb%25255B3%25255D.jpg?imgmax=800" width="500" height="375" /></a></p> Vitor Bornéohttp://www.blogger.com/profile/03105551521207136313noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-5930265896041972406.post-68483143974539368042014-11-09T13:10:00.001-08:002014-11-09T13:10:09.125-08:00awakening<p align="justify"> </p> <p align="justify">Havia essa moça no ponto de ônibus,  essa moça de beleza não convencional. Cabelos pretos, curtos. Blusa de alcinha, também preta. Tinha tatuado <i>awakening</i>  nas costas.  Fiquei confuso porque apesar disso ela aparentava muito sono. Quando chegou nosso ônibus, acho que nos dois já estávamos dormindo.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Por que alguém escreve "despertar" nas costas? O que significava? Um aviso, um chamado? Estão todos dormindo. Dançando uma dança morta. “Ei,  você,  desperte!”, talvez ela estivesse tentando gritar. Estaria sinalizando que estava desperta? Quis perguntar. Quis mesmo.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Quis sentar do lado dela, mas seria estranho,  ainda restavam bancos com os dois assentos vagos. Nessas horas que noto como os seres humanos se repelem. Sentei algumas cadeiras depois, junto à janela. Olhei para a rua. Coloquei o fone. Os óculos escuros.</p> <p align="justify"> </p> <p>Esqueci-me dela,  fechei os olhos e acordei.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify"><a href="http://lh6.ggpht.com/-IDxkSAM0aH0/VF_YK3Pnc9I/AAAAAAAAA8M/t5DlByCub-0/s1600-h/2014-10-20%25252021.32.17-1.jpg"><img title="2014-10-20 21.32.17-1" style="border-top: 0px; border-right: 0px; background-image: none; border-bottom: 0px; padding-top: 0px; padding-left: 0px; border-left: 0px; display: inline; padding-right: 0px" border="0" alt="2014-10-20 21.32.17-1" src="http://lh5.ggpht.com/-wN1jKBvpz18/VF_YL2nuTlI/AAAAAAAAA8U/sDDYlw4ETio/2014-10-20%25252021.32.17-1_thumb.jpg?imgmax=800" width="500" height="373" /></a></p> Vitor Bornéohttp://www.blogger.com/profile/03105551521207136313noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-5930265896041972406.post-13994228383543994642014-11-04T18:12:00.001-08:002014-11-04T18:16:52.859-08:00As cerejeiras da Praça Mario Lago<p align="justify">Tive essa manhã uma experiência do campo do extraordinário. Coisa incrível mesmo, daqueles momentos que você guarda consigo pelo resto da vida.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Estava no trabalho, no Centro do Rio. Muito cedo, eu ainda era o único na repartição. Passei pela janela e olhei para a paisagem que sempre ignoro. Dessa vez meus olhos foram surpreendidos por algo novo: a praça estava coberta de flores. Cerejeiras cintilavam um rosa doce, cintilante. Como que saídas de um filme do Kurosawa seus galhos meneavam em uma dança imóvel.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">De repente era primavera. Como pude deixar de notar?</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Do 8° andar  o dia ainda era silencioso o suficiente para ouvir o som dos pássaros. Senti-me tão pequeno. Aprisionado na minha gaiola de vidro. As pétalas que se soltavam, corriam pelo chão da praça,  guiadas pela brisa. O sol da manhã acariciava toda a cena e os cariocas... </p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Ah, os cariocas! Estes passavam pelas minhas cerejeiras com suas pastas,  sua pressa. Para eles eram simples ipês,  simples e vulgares ipês-rosa. Para mim eram as cerejeiras da Praça Mario Lago.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify"><a href="http://lh5.ggpht.com/-qD48i3a59hk/VFmHiE9vsgI/AAAAAAAAA7s/Seg7CJU3Tno/s1600-h/pra%2525C3%2525A7a%252520mario%252520lago%252520ipes%25255B8%25255D.jpg"><img title="praça mario lago ipes" style="border-left-width: 0px; border-right-width: 0px; background-image: none; border-bottom-width: 0px; padding-top: 0px; padding-left: 0px; display: inline; padding-right: 0px; border-top-width: 0px" border="0" alt="praça mario lago ipes" src="http://lh4.ggpht.com/-Or773Bj38HQ/VFmHi4S7nyI/AAAAAAAAA70/sEQfZHjvENA/pra%2525C3%2525A7a%252520mario%252520lago%252520ipes_thumb%25255B6%25255D.jpg?imgmax=800" width="500" height="375" /></a></p> Vitor Bornéohttp://www.blogger.com/profile/03105551521207136313noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5930265896041972406.post-22905071501747102322014-10-26T16:00:00.002-07:002014-10-26T16:01:23.044-07:00Marianne<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0.0001pt; text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0.0001pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: Helvetica, sans-serif; font-size: 10.5pt;">Perdoe-me, minha querida, mas não posso. Eu queria, juro que
queria, mas as condições que me impõe são por demais injustas. Tentei. Tentei
muito. Perdi horas do meu precioso sono meditando, buscando o caminho mais liso...</span><span style="font-family: "Times New Roman","serif"; font-size: 12.0pt; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR;"><o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 15.0pt; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0.0001pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: Helvetica, sans-serif; font-size: 10.5pt;">Falhei.</span><span style="font-family: "Times New Roman","serif"; font-size: 12.0pt; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR;"><o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 15.0pt; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0.0001pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: Helvetica, sans-serif; font-size: 10.5pt;">Recuso-me a continuar como estamos. Esse comodismo, essa prostituição do
que sonhamos chega ser criminosa. Mas o passo a frente que me
propõe... é como dois para trás.</span><span style="font-family: "Times New Roman","serif"; font-size: 12.0pt; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR;"><o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 15.0pt; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0.0001pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: Helvetica, sans-serif; font-size: 10.5pt;">Talvez a culpa não seja sua. Talvez seja minha. Que sonhei alto demais. Que me agarrei a utopias.</span><span style="font-family: 'Times New Roman', serif; font-size: 12pt;"><o:p></o:p></span></div>
<div>
<span style="font-family: Helvetica, sans-serif; font-size: 10.5pt;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0.0001pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: Helvetica, sans-serif; font-size: 10.5pt;">Então, por favor, perdoe-me se me recuso. Se me cansei das trocas de
acusações, das injúrias e ofensas. Do cinismo, das mãos que hora
afagam, hora esbofeteiam. Debati. Argumentei. Até mesmo amigos perdi!
Agora chega.</span><span style="font-family: "Times New Roman","serif"; font-size: 12.0pt; mso-fareast-font-family: "Times New Roman"; mso-fareast-language: PT-BR;"><o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 15.0pt; margin-bottom: .0001pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
<span style="font-family: Helvetica, sans-serif; font-size: 10.5pt;"> </span><span style="font-family: Helvetica, sans-serif; font-size: 10.5pt; line-height: 15pt;"> </span></div>
<br />
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0.0001pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: Helvetica, sans-serif; font-size: 10.5pt;">Recuso-me a escolher entre os dois cálices. Recuso-me optar pelo veneno
menos amargo. Entre as duas opções que me foram dadas, escolho a terceira: lavo
minhas mãos. E que você, minha amada, minha adorada
Democracia, possa morrer na cruz... Para em glória ser ressuscitada. </span><o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0.0001pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: Helvetica, sans-serif; font-size: 10.5pt;"><br /></span></div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://4.bp.blogspot.com/-ro5_EPr5OP4/VE186tH8XDI/AAAAAAAAA6k/VhBZEzdNhS4/s1600/Ef%C3%ADgie.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img alt="" border="0" src="http://4.bp.blogspot.com/-ro5_EPr5OP4/VE186tH8XDI/AAAAAAAAA6k/VhBZEzdNhS4/s1600/Ef%C3%ADgie.jpg" height="240" title="" width="400" /></a></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-bottom: 0.0001pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: Helvetica, sans-serif; font-size: 10.5pt;"><br /></span></div>
Vitor Bornéohttp://www.blogger.com/profile/03105551521207136313noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5930265896041972406.post-71120786227449963112013-05-19T20:05:00.001-07:002013-05-19T20:11:58.004-07:00Sinal vermelho<p align="justify">Na chuva havia aquele homem, um senhor escrevendo num caderno molhado. As páginas já estavam manchadas pela tinta de caneta que se soltava. Para cada palavra que o velho escrevia, a água levava outras dez. Escorriam azuis, misturavam-se com as poças da calçada.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Em pouco tempo a calçada estaria cheia de palavras. Substantivos e adjetivos. Verbos e ideias que inexoravelmente escorreriam para o ralo. Virariam esgoto. E então o texto estaria completo. Lavado pela chuva. E nunca teria existido.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Todavia o molhado escritor parecia decido. Com uma angústia no rosto, palavra por palavra, não se dava por vencido. </p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Tive dó.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Mas quando o ônibus saiu e perdi a vista da janela, percebi que as palavras daquele homem, sejam lá quais fossem, eram mais verdadeiras que todas as que jamais escrevi.</p> <p align="justify"><a href="http://lh3.ggpht.com/-odAAMP8WYkg/UZmUFP890DI/AAAAAAAAA0E/Fr-jOpFtn6U/s1600-h/sinal%252520vermelho5158304376_390771c007_z%25255B4%25255D.jpg"><img title="sinal vermelho5158304376_390771c007_z" style="border-top: 0px; border-right: 0px; background-image: none; border-bottom: 0px; padding-top: 0px; padding-left: 0px; border-left: 0px; display: inline; padding-right: 0px" border="0" alt="sinal vermelho5158304376_390771c007_z" src="http://lh5.ggpht.com/-x7gGA-2S0xA/UZmUGhaF2AI/AAAAAAAAA0M/UjF1_1s02do/sinal%252520vermelho5158304376_390771c007_z_thumb%25255B2%25255D.jpg?imgmax=800" width="500" height="375" /></a></p> Vitor Bornéohttp://www.blogger.com/profile/03105551521207136313noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5930265896041972406.post-69330675315554846702013-05-12T11:57:00.001-07:002013-05-12T12:35:11.633-07:00Coisa de mãe<p align="justify">Era Maricá, praia braba, oceânica. Naqueles dias a areia ainda era grande e branca. O mar um azul turquesa que só existe no verão.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">A mãe estava pegando sol ao lado da barraca, acompanhada de outra mãe, amiga descartável da praia. Conversava com olhos atentos: o seu estava logo abaixo, brincando com as outras crianças na areia molhada, indo e fugindo das ondas.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">“Não fica de costas para a onda!” gritava em alerta. “Não fico!”, respondia o filho quase sem pensar. Estava completamente imerso em suas importantes ocupações de engenheiros de castelos temporários, caçador de tatuís e colecionador de conchas. Havia um casal de irmãos da mesma idade e como criança solta logo se entende, antes de saberem os nomes uns dos outros os três já brincavam juntos.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">“A onda, olha a onda! Presta atenção!”</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">“Tá bom!”, respondia envergonhado.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Então uma das crianças gritou “Que é aquilo lá?” e apontou para umas coisas pretas que entravam e saiam da água mais para dentro do mar.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Largou suas preciosidades e se esticou o máximo que podia para olhar.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">“Baleias!”</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Seguiram-se gritos idênticos das outras crianças. “Baleias, baleias, baleias!”</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Eram no mínimo umas três barbatanas que entravam e saiam na água. A mãe levantou na mesma hora que percebeu o alvoroço.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">“Cuidado! Não é tubarão não?”, já com os olhos arregalados.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Mas não era. Ele sabia que não era. Eram baleias. Se alguém, naquele momento, o tivesse olhado nos olhos notaria que eles brilhavam. Riu da preocupação boba da mãe. Tubarão não era assim! Não que ele já tivesse visto um tubarão. Mas tubarão não era assim. Também nunca tinha visto baleia. Então veio aquele borrifo, aquele jorrar de água acompanhado por pelo barulho tão característico desses grandes cetáceos. Já tinha visto na tevê. Tinham que ser baleiras. Baleias de verdade!</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">“É baleia!”, afirmou categórico. </p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Ainda desconfiada a mãe foi sentando de novo embaixo da barraca. Mas pela precaução natural da profissão de tempo integral, gritou mais uma vez:</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">“Não fica de costas para onda!”</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Só que o filho, na ponta dos pés, estava tão fascinado com aquelas enormes criaturas tão próximas que só escutou conjunto de sons desconexos. Imediatamente virou-se.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">“O quê?” </p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">E tudo ficou escuro. O mar impiedoso o pegou pelas pernas e o arrastava pelas areias, para dentro. Claro, escuro, claro, escuro... o gosto de sal. E de repente, para o pequeno filho, o azul turquesa era negro. Sentiu medo. Pensou só na mãe que assistia.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Mas nesse momento um primo que tomava banho de mar ali perto entra na história para garantir o final feliz. Em poucos segundos já estava ele, com o priminho para fora d’água, erguido pelo pé, cuspindo água e areia. E vendo a risada do sobrinho, o coração da mãe voltou a bater, o sangue foi voltando para o rosto. </p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Em terra firme novamente, o filho foi andando até ela. Olho ardendo, nariz ardendo. Vê-la ali era um alívio maior que ser resgatado. Esqueceu até mesmo das baleias. Agora, só agora, sabia que estava tudo bem.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">“Você se machucou? Tá tudo bem? Entrou água no ouvido? Bateu com alguma coisa?”</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Ele quis abraça-la. Mas ficou com vergonha. As outras crianças pensariam que ele havia ficado assustado. É claro que ele não estava assustado.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">“Não, não, tá tudo bem. Ele me tirou.”</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Ela entendeu aquele olhar. Sempre entendia. Respirou fundo, aliviada, e falou:</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">“Eu não disse para você não ficar de costas para onda!”</p> <p> </p> <p><a href="http://lh6.ggpht.com/-qII0y2f-rQ4/UY_l_Lja0SI/AAAAAAAAAzY/XciPfWH8ULk/s1600-h/baleias%252520BW%25255B4%25255D.jpg"><img title="baleias BW" style="border-top: 0px; border-right: 0px; background-image: none; border-bottom: 0px; padding-top: 0px; padding-left: 0px; border-left: 0px; display: inline; padding-right: 0px" border="0" alt="baleias BW" src="http://lh3.ggpht.com/-fbyUz2LNTuc/UY_mAHSHvLI/AAAAAAAAAzg/fHh2b2QNWUc/baleias%252520BW_thumb%25255B2%25255D.jpg?imgmax=800" width="500" height="375" /></a></p> <p> </p> <p align="right"><font size="2">Dedicado à Tônia Mára de Paula Bornéo, que confunde baleias com tubarões, mas há 26 anos não tira os olhos de mim. </font></p> Vitor Bornéohttp://www.blogger.com/profile/03105551521207136313noreply@blogger.com3tag:blogger.com,1999:blog-5930265896041972406.post-91840060531679257602013-03-17T16:19:00.001-07:002013-03-17T16:19:11.315-07:00Visão de Carnaval<p align="justify">Vamos juntos cortando a multidão, com cuidado para não nos perder. Vou na frente, abro caminho entre foliões bêbados e cansados para ela passar tranquila. Passamos por uma mulher, um Neandertal, um policial, um bombeiro... Todos de mentira, menos o Neandertal. Não choveu, mas a rua está molhada. A Cidade está fedendo a cerveja e a urina fresca. Mesmo assim estão todos sorrindo e eu sorrio também. Sorrio pelo hábito. Um sorriso cheio de tensão, mas um sorriso.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Em algum lugar está tocando uma marchinha. Lembro o que estou fazendo aqui. É para lá que vamos. Parece que alguma coisa explodiu. Não me assusto porque ninguém se assusta. Hoje somos todos um só. </p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Com a desculpa de não dos perdermos, estendo minha mão para atrás. Só quero sentir seu toque. Aperto o passo sem soltar sua mão. Ela anda com cuidado para não sujar os pés. Parece deslumbrada e assustada enquanto salta com um jeito de bailarina.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Corro uma esquina, duas, três... Para onde nós vamos? Esse calor tá de matar! Vencemos. Um refrigerante, uma lata de cerveja. Estamos ouvindo o bloco, estamos cantando o bloco.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Ela canta. A música é velha, mas ela sabe a letra toda, o vai entoando como um hino. Um hino às coisas velhas. A beleza da marchinha é como a dela. Triste.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">E num segundo que fito seus olhos, sei que ela é demais para o mundo. E a vida não basta como é. Nem são suficientes todos os livros. </p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Ela passa perto e cheiro seus cabelos. Fico surpreso porque ainda estão cheirosos. Eu canto junto, eu pulo junto. Eu só queria dizer tudo bem, eu também vejo isso, eu também sinto isso. Também sou Carnaval. Também estou aqui. Se ficarmos perto eu a protejo como posso. Tenho vontade de puxa-la para mim e beija-la. Mas não faço isso. Seria uma vulgaridade. Fico sem graça. Ela é uma heroína. Eu não sou ninguém.</p> <p> </p> <p><a href="http://flavsparadise.tumblr.com/" target="_blank"><img style="background-image: none; border-bottom: 0px; border-left: 0px; padding-left: 0px; padding-right: 0px; display: inline; border-top: 0px; border-right: 0px; padding-top: 0px" title="Visão de Carnaval" border="0" alt="Visão de Carnaval" src="http://lh3.ggpht.com/-JHpT7uHI1Zc/UUZPbVEfDEI/AAAAAAAAAyc/hxPTmCFwkDs/Vis%2525C3%2525A3o%252520de%252520Carnaval%25255B5%25255D.jpg?imgmax=800" width="500" height="373" /></a></p> <h5 align="right">Imagem de <a href="http://flavsparadise.tumblr.com/" target="_blank">Flávia Kingsbury®</a></h5> Vitor Bornéohttp://www.blogger.com/profile/03105551521207136313noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-5930265896041972406.post-78433024937581420972013-03-10T21:22:00.001-07:002013-03-17T17:50:47.838-07:00A Menina e o Gigante a vapor<p align="justify">Em outro tempo, em outro lugar, havia uma Menina. Uma Menina que morava perto de um Bosque, um grande e belo bosque, cheio de árvores frutíferas, animais e flores coloridas. E o amava. Amava daquela forma que só as crianças são capazes de amar, aquela capacidade de ternura que o tempo vai levando, inverno após inverno. </p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Foi no fundo do Bosque, onde as árvores cresciam mais altas que o sol, que a Menina o encontrou: um gigante todo feito de metal. Tinha o tamanho de uma pequena árvore e pelo seu corpo havia dezenas de pistões e engrenagens à mostra. Na barriga, ou no lugar onde deveria ser a barriga, ficava uma fornalha, igualzinha as que a Menina tinha visto nas locomotivas a vapor.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Seus olhos eram fendas vazias, mas bem lá no fundo podia-se ver um brilho leve, opaco e triste. Teve então, a Menina, dó do Gigante, sozinho, abandonado naquele canto escuro do Bosque. Lembrou-se de como faziam para os trens funcionarem, juntou um pouco de lenha que estava espalhada a sua volta e pôs na “barriga” daquilo que parecia um monstro adormecido.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Imediatamente, chamas brotaram-se dentro da fornalha. Ouviu-se o barulho de engrenagens e das fendas dos olhos surgiu um brilho vivo, vermelho como o fogo. O chão começou a tremer enquanto a grande criatura se levantava. Folhas caíram e pássaros fugiram. Assustada, a Menina correu para esconder-se atrás de uma árvore, mas assim que chegou ao refúgio, ouviu uma voz metálica:</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">"Não tenha medo”, disse o Gigante. “Você salvou minha vida, então a partir de agora serei seu fiel servo."</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Tímida, ainda relutante, foi deixando seu esconderijo movida principalmente por uma enorme curiosidade.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">"Mas o que é um servo?", perguntou.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">"Um servo é alguém que obedece todas as suas vontades como se fossem as próprias, sem questionar."</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Aos olhos da Menina aquilo não parecia certo. Respondeu então:</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">"Humm... acho q não quero ter um servo, não. Mas podemos ser amigos, pode ser?"</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">"Mas o que é um amigo?"</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Aquela pergunta a pegou de surpresa! A Menina nunca tinha parado para pensar o que era um amigo. Até porque, nunca tinha tido muitos amigos. Pensou, pensou, e finamente respondeu:</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">"Um amigo é alguém que nem sempre faz as suas vontades, mas sempre faz o melhor por você."</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">"Acho então que posso ser seu amigo, Menina!"</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">O coração da Menina alegrou-se e as válvulas do Gigante apitaram de tanta felicidade.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">A Menina ouviu então a historia do novo amigo. O Gigante a vapor era um escravo. Havia sido construído apenas para obedecer aos caprichos dos homens. Um dia, cansado, decidiu refugiar-se no Bosque.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Juntos eles foram aos cantos mais distantes. Acompanhada pelo amigo Gigante, a Menina não precisava ter medo de nada.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Mas onde quer que fossem os animais fugiam assustados com o barulho que o Gigante fazia para se mover. Em pouco tempo, não se ouvia mais pássaros pelo Bosque. A Menina se entristecia, não entendia porque os animais tinham medo. Afinal, ele era bom! Era amigo dela! E era tão bom ter um amigo depois de tanto tempo só.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Só que a fome do Gigante era insaciável. Quanto mais o tempo passava, mais lenha ele precisava queimar para continuar funcionando. Finalmente, durante um dos seus passeios, ao notar uma sombra no rosto da amiga, o Gigante falou:</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">“Oh, Menina, Menina... você não deveria ter me salvado. Fui criado apenas para destruir. Cansado de consumir tudo que amava, escolhi esse Bosque para deixar de existir. Mas quando vi você, perdi a coragem. Porém se eu continuar irei cortar e queimar todo esse bosque que tanto ama e você acabaria me odiando.”</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">“Mas deve haver outro jeito! Outro combustível para você funcionar!”</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Comovido com o empenho da Menina, o Gigante a vapor pensou. Teria sorrido se sua boca tivesse sido projetada para isso.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">“Existe outra maneira.” disse. “Dizem que existe uma mágica secreta ainda mais poderosa do que a que mantem meu núcleo a vapor funcionando. Uma vez ativada, viverei para sempre, sem nunca mais precisar derrubar uma árvore sequer.”</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">“E como funciona?”</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">“Vou precisar de sua ajuda. Vá para casa e fique lá. Amanhã, quando voltar, estará acabado.”</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">A Menina foi embora, esperou e esperou. Esperou por uma noite interminável e chegou a pensar que o sol jamais nasceria. Mas o dia chegou e a Menina correu para o Bosque junto com os primeiros raios de luz. E não encontrou o que procurava. </p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Por horas e horas, correu por toda aquela imensidão. Olhou atrás de cada árvore, cada pedra. Mas não havia sinal de seu amigo. </p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Encontrou então as enormes pegadas do Gigante perto de um lago, um grande lago na parte central do Bosque. Ali elas sumiam. Ali a Menina sentou e chorou. E por muitos dias a cena se repetiu. Sempre que a saudade do Gigante apertava, corria até o lago e chorava enquanto buscava todas as boas lembranças que estavam guardadas no seu coração. </p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Foi então que antes que todas as suas lágrimas secassem, ouviu que os pássaros estavam cantando novamente pelo Bosque. Pôs a mão sobre o peito e, depois de semanas, sorriu: sentiu que a mágica havia funcionado. Nunca mais viu o Gigante que, no Bosque, viveu para sempre. </p> <p> </p> <p><a href="http://lh3.ggpht.com/-niWoZb0g0W0/UT1cC_JKwWI/AAAAAAAAAx4/7EEuLzFEBmE/s1600-h/TinMan1%252520BW%25255B6%25255D.jpg"><img style="background-image: none; border-right-width: 0px; padding-left: 0px; padding-right: 0px; display: inline; border-top-width: 0px; border-bottom-width: 0px; border-left-width: 0px; padding-top: 0px" title="TinMan1 BW" border="0" alt="TinMan1 BW" src="http://lh4.ggpht.com/-17e9GI0-KoM/UT1cDkiYmpI/AAAAAAAAAyA/hNGKEi6Vbd4/TinMan1%252520BW_thumb%25255B4%25255D.jpg?imgmax=800" width="500" height="323" /></a></p> Vitor Bornéohttp://www.blogger.com/profile/03105551521207136313noreply@blogger.com4tag:blogger.com,1999:blog-5930265896041972406.post-83539250536672044652012-12-07T08:29:00.001-08:002012-12-14T21:52:15.003-08:00A Barbearia<p align="justify">Costumava ir a uma barbearia, dessas bem tradicionais. Hoje em dia lugares assim são difíceis de encontrar – entraram em extinção nos anos 1990 graças ao metrossexual moderno e aos salões de beleza unissex. Imaginem então o quão grande foi minha felicidade quando numa tarde, voltando do almoço, deparei-me com uma dessas num cantinho esquecido, entre a Tijuca e a Praça da Bandeira.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Perto da porta um escudo do Vasco dividia espaço com um do América e adiante, dois homens compenetrados trabalhavam de jaleco branco. Tinha um piso xadrez, preto e branco, – nem de longe tão limpo quando dos salões de beleza – do tipo que se usava muito na década 1960, e uns bancos de couro com jornais e cadernos de esportes abertos. Nenhuma revista de fofoca. Sobre ele, um gato branco e muito sério dizia claramente que havia chegado primeiro.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Era uma beleza! Não que eu tenha qualquer coisa contra salões, mas o clima de uma barbearia é incomparável. Ao entrar, notam-se logo duas diferenças. A primeira é a austeridade. Ao invés do falatório, costuma imperar um silêncio cortado apenas pela ação das tesouras – a exceção fica para os dias de jogo. A segunda diferença é o odor: ao invés do típico cheiro de químicas capilares, o ar em uma autêntica barbearia é sempre impregnado por uma mistura de creme para barbear e talco. Nunca tive um avô, mas se avôs têm um cheiro, deve ser esse.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Logo nessa primeira visita quem me atendeu foi o dono, Seu Fernando. Tornei-me cliente fiel. Vascaíno de poucas palavras e cabelos todos brancos, parecia filho de português. Manejava a tesoura como um escultor maneja um cinzel. “É uma arte”, dizia. “Não pode ser feito de qualquer jeito”. O corte era demorado e um tanto <i>démodé</i> para os dias de hoje, mas valia a pena pela conversa. Quando falava, Seu Fernando era um intelectual de opiniões simples, todavia profundas. Podia ser política ou o Campeonato Brasileiro, o homem tinha o dom da síntese. Aquela simpatia silenciosa que só os de mais idade costumam ter.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Uma beleza, a barbearia. Saía de lá sempre com sorriso no rosto e nem sei bem o porquê.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Sou assim mesmo. Nesse mundo digital, às vezes sinto-me um homem analógico. Enquanto todo mundo sai desesperado atrás do novo, tenho um apreço pelo antigo. Pelo velho. Já me disseram que nasci velho. Deve ser por isso. </p> <p align="justify"></p> <p align="justify"> </p> <p align="justify"><a href="http://lh4.ggpht.com/-lTHDWzio8G8/UMIZYFWJzKI/AAAAAAAAAwg/lborCBXYXo4/s1600-h/BARBEARIA%25255B4%25255D.jpg"><img style="background-image: none; border-right-width: 0px; padding-left: 0px; padding-right: 0px; display: inline; border-top-width: 0px; border-bottom-width: 0px; border-left-width: 0px; padding-top: 0px" title="BARBEARIA" border="0" alt="BARBEARIA" src="http://lh5.ggpht.com/-8Q1OMe5Z8f8/UMIZaJiSqMI/AAAAAAAAAwo/KZHioYm37v8/BARBEARIA_thumb%25255B2%25255D.jpg?imgmax=800" width="500" height="375" /></a></p> Vitor Bornéohttp://www.blogger.com/profile/03105551521207136313noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-5930265896041972406.post-89006379765639038232012-12-04T19:43:00.001-08:002012-12-04T21:02:44.872-08:00História de samba<p align="justify">Não sei exatamente quando surgiu meu amor pelo samba. Mas se volto em busca de uma primeira memória, chego até aos meus tempos de moleque, lá em Quintino. Vem-me a imagem de minha avó cantando “Último desejo” enquanto cozinhava e punha a roupa na máquina de lavar. Era comum que cantasse enquanto cumpria seus afazeres domésticos e – já que ela costumava começar cedo – não foram poucas as vezes que acordei assim, com música. “As rosas não falam”, “Retalhos de cetim”, “Bandeira branca”... Seu repertório era dos melhores e aprendi amar as canções que ouvia muito tempo antes de saber nomear os seus compositores.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Mas se meu amor pelo samba é coisa antiga, o hábito, este é recente.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Domingo passado, dia 2 de dezembro, foi Dia Nacional do Samba: uma data que até uns dois anos atrás nem sequer sabia da existência. Foi nessa época que através de uma colega do trabalho (que mais tarde descobri ser um daqueles irmãos perdidos no mundo que a gente às vezes tem, mas desconhece) fui à Pedra do Sal pela primeira vez. Até então, nunca tinha posto os pés na Gamboa. Pequena África era coisa de livro – e de uns poucos.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Foi um amor à primeira vista. A tal Pedra era muito mais tímida do que eu imaginava, mas tinha o peso de anos e anos de uma história que eu fui sentindo, fui conhecendo um pouco mais, em cada verso que ouvia. O samba entrou na minha vida; eu não saí mais dele.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">É por isso que gosto tanto dessa comemoração, do Dia do Samba. Muito mais que do Carnaval. Tenho a sensação de que o Carnaval de hoje em dia – ao menos aqui pelo Rio – é a coisa mais antissamba que já vi. As pessoas enlouquecem, saem por aí brigando, depredando e transformando a cidade toda em um grande mictório. Na quarta-feira de cinzas parece que o furacão Sandy passou pela cidade. Morre a cortesia. Morre o que eu mais amo no samba.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Para mim, é nas rodas que mora o “samba verdadeiro”. Acredito piamente que cada vez que um grupo de camaradas se reúne em volta de uma mesa, na porta de um bar, está remetendo a coisa antiga, as primeiras rodas de samba, lá no Recôncavo Baiano, e antes disso, no além mar. Louvam-se os orixás. Voltam-se as origens do batuque. Celebra-se a vida.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">O samba é o Rio que não está nos postais. Porque cá entre nós, samba que é samba é do subúrbio, das vielas do Centro, do Porto. A Zona Sul é muito linda, mas é bossa nova. Não sou preconceituoso, amo o Rio de Janeiro como um todo. Mas não adianta: a princesinha do mar não sabe sambar igual a mulata da Portela. Tem seus encantos, mas faltam-lhe os segredos e histórias da mulher madura, experimentada.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Isso não quer dizer que não fique feliz quando vejo esses rapazes emplumados e moças com vestidos embalados a vácuo em algum desses sambas mais <i>society</i>. De alguma forma é o carioca, que a geografia e a história insistiram em separar, se conhecendo. Mas é sempre bom lembrar que o samba nasceu preto e, graças aos deuses, continua preto.</p> <p> </p> <p><a href="http://lh5.ggpht.com/-vO15Z9hu7zY/UL7CyjSI_lI/AAAAAAAAAwE/ri83-hxwqkk/s1600-h/395053_378059305615089_918095765_n%25255B6%25255D.jpg"><img style="background-image: none; border-right-width: 0px; padding-left: 0px; padding-right: 0px; display: inline; border-top-width: 0px; border-bottom-width: 0px; border-left-width: 0px; padding-top: 0px" title="395053_378059305615089_918095765_n" border="0" alt="395053_378059305615089_918095765_n" src="http://lh4.ggpht.com/-tbzLuqHh35k/UL7C0AzVBUI/AAAAAAAAAwM/Vftv7K6g19Q/395053_378059305615089_918095765_n_thumb%25255B4%25255D.jpg?imgmax=800" width="534" height="402" /></a></p> Vitor Bornéohttp://www.blogger.com/profile/03105551521207136313noreply@blogger.com6tag:blogger.com,1999:blog-5930265896041972406.post-29077528231231936972012-11-29T12:41:00.001-08:002012-11-29T12:43:58.030-08:00Resposta do Rio<p align="justify">Essa semana li que Niterói foi eleita por um site gringo como a cidade do mundo com mais mulheres bonitas. Vou confessar: como carioca e apaixonado pela espécie, senti-me um pouco enciumado. Como assim, Niterói desbancando o Rio? Como uma cidade que chama “joelho” de “italiano” pode desfrutar de tamanha honraria?</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Depois contemporizei: o que afinal esses americanos entendem de mulher? Que importa se de lá saíram várias <i>top models</i> internacionais? A beleza da carioca vai muito além das passarelas!</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Só quando recobrei a razão, notei que estava sendo vítima do meu próprio bairrismo. A verdade é que nós, cariocas, temos certa má vontade com nossa irmã mais nova fluminense. Não é uma coisa declarada, como é o caso com São Paulo – nossa arquirrival de concreto e cinza. Carioca não leva Niterói muito a sério relegando-a um status de “café com leite”. É quase um distrito do Rio de Janeiro, ou um bairro grande, que fica do outro lado da Baía. Sinônimo de longe, de ponte, de barcas. Chateação. Onde já se viu, Niterói tem a ousadia de existir nas insondáveis terras do outro lado da poça!</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Mas venhamos e convenhamos: não é fácil “ser Niterói”, assim, do ladinho do Rio. Deve ser como, sei lá, ser a irmã mais nova da Gisele Bündchen. As comparações são inevitáveis! Como fazer frente à Ipanema, Copacabana e outras unanimidades internacionais? Tamanha é a megalomania do Rio, que além do Corcovado, ainda tem o Pão de Açúcar! Pobre Niterói! Tão longe da Região dos Lagos e tão perto do Rio de Janeiro.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Que injustiça minha com a Cidade Sorriso! Lembrei que das vezes que caminhei pelas Terras de Arariboia também fiquei impressionado com a beleza das nativas. Com seus prédios de Niemeyer e suas praias aconchegantes, Niterói tem toda uma graça própria. Descer da barca vindo do barulhento e (adoravelmente) caótico Rio de Janeiro é sempre uma experiência. Pode ser que algum ar afrancesado, um clima de província sofisticada, tenha sobrevivido à França Antártica. Não sei ao certo. Preciso de mais expedições para formar uma opinião sólida. Mas caminhar pela orla de Niterói é, quase sempre, um <i>spa</i> para alma.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Preciso reconhecer: as niteroienses tem mesmo um charme! Talvez seja o ar de mulher meio séria, mas delicada, o mesmo que deixa tão atraente as secretárias, médicas e executivas. Um sério leve. As mulheres de Niterói tem a austeridade das belo-horizontinas, mas com a graça das cariocas. E tem o sotaque. Que indecência é o sotaque das mineiras! Uma vez li que o sotaque mineiro deveria ser ilegal, imoral ou engordar. Concordo completamente. E Niterói tem essa coisa: tão perto do Rio, mas com um falar próprio, distinguível apenas aos ouvidos mais atentos. Não chega a ser um sotaque. É mais um jeitinho “assim, assim”. Menos chiado, com menos gírias.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Tá aí, se Belo Horizonte tivesse mar, seria Niterói. Até o nome é sugestivo. Afinal, existe no mundo horizonte mais belo que o de Niterói? </p> <p> </p> <p><a href="http://lh4.ggpht.com/-Na0Hz2PlgSg/ULfIiNBIrHI/AAAAAAAAAvw/FfBYnYGBTuk/s1600-h/Vista-do-Rio-da-Orla-de-Niteri%25255B1%25255D.jpg"><img style="background-image: none; border-bottom: 0px; border-left: 0px; padding-left: 0px; padding-right: 0px; display: inline; border-top: 0px; border-right: 0px; padding-top: 0px" title="Vista do Rio da Orla de Niterói" border="0" alt="Vista do Rio da Orla de Niterói" src="http://lh4.ggpht.com/-QC4qtu6PHUo/ULfIizBZ9xI/AAAAAAAAAv0/Yf-23KdSFPU/Vista-do-Rio-da-Orla-de-Niteri_thumb%25255B1%25255D.jpg?imgmax=800" width="538" height="358" /></a></p> Vitor Bornéohttp://www.blogger.com/profile/03105551521207136313noreply@blogger.com3tag:blogger.com,1999:blog-5930265896041972406.post-27082931485734739062012-11-08T19:45:00.001-08:002012-11-09T03:24:49.629-08:00uma confissão<p> </p> <p align="justify">Durante a noite encontro uma liberdade para escrever que por algum motivo o sol não me permite. Notei recentemente que meus textos têm ficado cada vez mais parecidos com relatos. Ilusão. Não são estes textos mais relatos que outros antes escritos. Mais pessoais. Todos são algum produto do que acontece quando torço. E sangro. São o que escorre. Não são meus relatos. Não são minhas confissões. São uma conversa causal, uma voz que empresto a uma porção de mundo oculta, querendo mostra-se. São clichês. São notas noturnas do óbvio. Mentiras absolutas. Mas verdadeiras.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify"><a href="http://lh5.ggpht.com/-165VJKrQf50/UJyAUqd2GOI/AAAAAAAAAu4/Ffim0vuKBk4/s1600-h/Uma%252520confiss%2525C3%2525A3o%25255B5%25255D.jpg"><img style="background-image: none; border-right-width: 0px; padding-left: 0px; padding-right: 0px; display: inline; border-top-width: 0px; border-bottom-width: 0px; border-left-width: 0px; padding-top: 0px" title="Uma confissão" border="0" alt="Uma confissão" src="http://lh6.ggpht.com/--DHGR9s9UhI/UJyAWBQtfMI/AAAAAAAAAvA/0sJX_GZ04tg/Uma%252520confiss%2525C3%2525A3o_thumb%25255B2%25255D.jpg?imgmax=800" width="525" height="385" /></a></p> Vitor Bornéohttp://www.blogger.com/profile/03105551521207136313noreply@blogger.com3tag:blogger.com,1999:blog-5930265896041972406.post-37557503718599620252012-11-02T11:27:00.001-07:002012-11-07T19:20:52.392-08:00de como não conheci meu grande amor<p>Foi em uma noite de segunda-feira. Olhou-me curiosa por detrás de seu sanduíche quando me sentei – toda a solidão do mundo naquele sanduíche. </p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Tinha olhos cansados, do tipo que parecem fartos do mundo, mas que ainda não desistiram dele. Protegidos por óculos de grossos aros olhavam para um celular, sem parar, esperando uma ligação que não vinha. A frustração só a fazia mais bela. </p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Compreendi que a solidão dela era minha solidão. </p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Sozinha. E linda. Era o outono. Ali, da mesa ao lado, apaixonei-me imediatamente. Naquele <i>fast food</i> vazio, éramos feitos um para o outro. </p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Inquieta, parecia incomodada com um dos seus cachos que teimava em cair sobre o rosto. Tinha cachos castanhos e uns olhos de amêndoa. </p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">O telefone não tocava. Sentia seu desalento. Pensei que deveria pular para a mesa do lado, juntar nossas solidões. </p> <p align="justify"> </p> <p align="justify"><i>Não espere mais</i>, eu diria. <i>Também cansei de esperar. Esse tempo passou. Vem comigo. Vamos viver. Gritar esse berro entalado no silêncio. Rir até gargalhar de como a vida é simples quando se ama. Do passado que passou. Do futuro, que é agora. Vem, pega minha mão...</i> </p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Mas só terminei meu sanduíche e parti, com minha solidão e covardia, para longe dali.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify"><a href="http://lh6.ggpht.com/-hER9VK_flvM/UJQQnCO9lAI/AAAAAAAAAsU/SEnrCmbH4pE/s1600-h/VagasdeEmpregonoMcDonalds%25255B5%25255D.jpg"><img style="background-image: none; border-right-width: 0px; padding-left: 0px; padding-right: 0px; display: inline; border-top-width: 0px; border-bottom-width: 0px; border-left-width: 0px; padding-top: 0px" title="VagasdeEmpregonoMcDonalds" border="0" alt="VagasdeEmpregonoMcDonalds" src="http://lh3.ggpht.com/-CYO-OOqWzS0/UJQQo9k_rRI/AAAAAAAAAsc/cymkQ0ZS860/VagasdeEmpregonoMcDonalds_thumb%25255B3%25255D.jpg?imgmax=800" width="517" height="413" /></a></p> Vitor Bornéohttp://www.blogger.com/profile/03105551521207136313noreply@blogger.com4tag:blogger.com,1999:blog-5930265896041972406.post-15455536920404526292012-10-25T20:38:00.001-07:002012-11-07T19:21:20.712-08:00A Pátria de controle remoto<div> <p align="justify">Hoje à noite, quando cheguei em casa e vi a TV ligada com todos aqueles personagens estranhos foi como se alguma coisa em minha sala estivesse faltando. Confesso, o final de <i>Avenida Brasil</i> me deixou meio órfão. Jantar acompanhado de Rita, Carminha, Tufão e companhia, já fazia parte das minhas noites. Não assistia a uma novela com uma fidelidade tão canina há anos!</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Esse é o momento que, em choque, você leitor fiel, fala "é sério isso? Ele escreveu uma crônica sobre novela mesmo?" Sim. Escrevi. E vou perdoá-lo se quiser parar de ler agora. Fidelidade não está na natureza do leitor mesmo. Além do que, essa é outra daquelas longas crônicas, que ninguém tem mesmo paciência de ler inteiras.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Quando comecei a escrever, enumerava argumentos de porque <i>Avenida Brasil</i> revolucionou muitos aspectos do nosso já conhecido folhetim das vinte e uma horas. Logo, porém, vi que não era isso que eu realmente queria fazer. Poderia escrever páginas e páginas rebatendo críticas, mas não mudaria o fato de que não sou teórico literário ou coisa parecida e nem, graças aos deuses, tenho nenhuma pretensão de ser. Literatura – assim como tudo mais que veio dela – para mim é arte. Por mais que reconheça o valor da teoria, acredito que esta sempre estará aquém da mais simples lágrima de um observador leigo, mas sensível.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">O que quero dizer é que não pretendo defender nenhuma ideia ou ponto de vista. Esta crônica não se propõe a artigo. Entre as maravilhas da televisão atual está a simplicidade que é mudar de canal. Ninguém é obrigado a gostar de novela assim como ninguém é obrigado a gostar de Machado de Assis. Eu, por exemplo, amo Machado e adorei <i>Avenida Brasil</i>, mas detesto José de Alencar. O homem pode ter sido um gênio, mas sou completamente incapaz de ler um dos seus romances indianistas sem ir do riso ao sono profundo em questão de instantes. Gosto tem dessas coisas!</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Para mim a beleza de <i>Avenida Brasil </i>foi ver exatamente quanta gente, dos mais variados tipos, escolheu não mudar de canal. Emociono-me com coisas capazes de unir em uma única conversa pessoas diferentes. É por isso que faço questão de, mesmo não sendo o mais assíduo dos torcedores, saber sempre uma coisa ou outra do meu vascão. É o assunto que tenho com o taxista. A viagem fica mais agradável quando tem o campeonato brasileiro em jogo. Aliás, no dia do último capítulo da novela as ruas ficaram tão vazias que parecia até final do campeonato brasileiro, ou até dia de jogo do Brasil em Copa do Mundo! Se a seleção é a pátria de chuteiras, <i>Avenida Brasil</i> foi a pátria no sofá, de controle remoto. Teve esse efeito “agregador”. Conseguiu o mérito máximo de um folhetim: alcançar tanto o tradicional público das novelas, quanto um público novo, muito mais exigente, sem descaracterizar o gênero. Alguns dirão que, assim como o futebol, <i>Avenida Brasil</i> foi só mais um pouco do “ópio do povo”. De fato, estes não deixam de ter uma parcela de razão. Mas do Japão ao Norte Europeu, povos mais conscientes e com menos problemas que nós, brasileiros, consomem programações muito mais imbecilizantes que nossas novelas. E vale lembrar, nem só de filme iraniano em preto e branco vive a cultura. Um homem também precisa de sua dose de mediocridade para ser feliz! </p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Uma das coisas que eu mais gostava na novela de João Emanuel Carneiro era que quando estava sentado em frente à tevê me divertia sem ter que pensar muito (que é o que normalmente quero quando ligo a televisão) ou ser bombardeado por toda aquela baboseira falsamente engajada que tanto povoa o horário nobre. Com suas tramas maquiavélicas, vilões muito loucos e mocinhos bem idiotas, <i>Avenida Brasil </i>tinha algo das HQs que eu lia quando era mais moleque. Eram cheias de clichês, o que não fazia delas menos interessantes.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">O Divino foi um retrato caricato, mas nem por isso menos verdadeiro, do subúrbio carioca nessa segunda década do século XXI. Quem, como eu, cresceu ou simplesmente frequenta essa parte da cidade sabe do que estou falando: é impossível não reconhecer naquele núcleo alguns dos personagens característicos do dia a dia desses bairros. Isso por si só já fez a obra um marco na história da teledramaturgia brasileira. Antes mesmo de acabar, já havia entrado num hall seleto ocupado por clássicos do gênero como <i>Roque Santeiro</i>, <i>Vale Tudo</i> e <i>Que Rei Sou Eu</i>.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">E por falar no Divino, também notei outro efeito que a novela parece ter tido: <i>Avenida Brasil</i> resgatou um pouco o orgulho do subúrbio. Nunca ouvi tanta gente dizer com a voz firme que mora na Zona Norte, em Madureira, no Méier ou em tantos outros “Divinos”. É claro que ninguém gosta da violência ou dos outros problemas – que não são poucos. Mas também é bom viver em um lugar onde as pessoas tem mais calor, se enxergam mais... Poder sair na rua e encontrar uns camelôs, comer um salgado com refresco sem se sentir assaltado, jogar um futebol no campo de várzea. Isso é também ser carioca. E digo mais: por essas coisas, acho que até abro mão da vista para o mar.</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify">Felizmente, a novela acabou na última sexta-feira. Digo felizmente porque se uma parte de mim sentirá falta dos embates Rita vs. Carminha, a outra agradece por ter minhas noites de volta. Ao menos até estrear o próximo bom folhetim...</p> <p align="justify"> </p> <p align="justify"><a href="http://lh4.ggpht.com/-LrTr5sRIrow/UIoFrQ8AgyI/AAAAAAAAAro/BLu3v-2kBXk/s1600-h/2012-10-21%25252019.01.33%25255B6%25255D.jpg"><img style="background-image: none; border-right-width: 0px; padding-left: 0px; padding-right: 0px; display: inline; border-top-width: 0px; border-bottom-width: 0px; border-left-width: 0px; padding-top: 0px" title="2012-10-21 19.01.33" border="0" alt="2012-10-21 19.01.33" src="http://lh3.ggpht.com/-4SFH2C5cjWU/UIoFsn4qszI/AAAAAAAAArw/Vrm0K3ONkLI/2012-10-21%25252019.01.33_thumb%25255B4%25255D.jpg?imgmax=800" width="507" height="531" /></a> </p> </div> Vitor Bornéohttp://www.blogger.com/profile/03105551521207136313noreply@blogger.com2